Flávio Pinto
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Por Flávio Pinto - 14/8/2018 15:15:42 |
Rey e mais um caso de Zeca do Correio Flavio Pinto Mais uma vez – com prazer - registramos essa estória clássica que o amigo e escritor Reynaldo Veloso Souto contou no seu aclamado livro. mSobre um outro causo especial de Zeca do Correio, nosso saudoso amigo e querido personagem, filósofo, boêmio e carteiro nas horas vagas... São fatos beirando os limites do imaginário, acontecidos no bar de Zim Bolão (lembrança) e guardados para sempre na memória de quem participou. Antes da publicação do seu ” Histórias do Rey “ já a repetira diversas vezes (a pedidos) e se divertiu juntamente com os ouvintes – ou mais - durante anos. As novas gerações também poderão buscar naquela Montes Claros antiga a confirmação de fatos inenarráveis para poderem –por instantes – tentardeixar de lado o atual/imprescindível aparelho celular e papear um pouquinho. Só um tempo longe das conversas sérias e das mil e uma informações da internet não faz mal a ninguém, nem aos mais velhos almejando outras justas prosopopeias. É saudável, podes crer! Pelo menos acreditamos que seja... “Num elogiado filme, Buck Jones, dos mais famosos do cinema mudo e falado, ídolo principal do faroeste, cultuado num lugar situado a 8.000 quilômetros de distância como se fosse um herói nacional , montado no imponente Silver, que depois inspirou o mesmo nome a outro cavalo branco do seriado Zorro e Tonto ( “Lone Ranger” ) desce na porta do bar, com a roupa impecável , sem uma mancha de poeira. Na mesa dos fundos, no canto , toda a sorte de renegados; índios ferozes armados e vestindo maltrapilhos uniformes militares; bigodudos facínoras mexicanos ostentando no peito bandoleiras cruzadas - repletas de balas calibre 45 – jogavam disputado jogo de cartas, ao mesmo tempo em que o nosso herói se acercava do balcão. Pôquer fechado, o que aumentava mais a expectativa. Um mal-encarado barman- camisa de manga comprida, listada, liga demeia feminina no braço esquerdo - se apressa, com uma garrafa de uísque sem rótulo e lhe oferece a garrafa curraleira mais vagabunda da casa – ostensivamente - numa atitude implicante e hostil. Na outra mão, um pequeno copo para doses. A polida resposta do mocinho veio na hora. -Obrigado, gostaria de um copo de leite, por favor! Buck Jones foi incisivo, nas palavras dirigidas ao afoito empregado. Este, como era de se esperar, prontamente retaliou (demonstrando óbvio desrespeito), num significativo olhar de desdém à mesa dos facínoras, dando-lhes força para aumentar os apupos. Não se precisou de mais nada para, em seguida, Zeca se levantar, olhar para a tela todo circunspecto e calmamente sentenciar, em alto e bom som - com rara sutileza - fazendo os espectadores se emocionarem e caírem rapidamente na gargalhada. - Cês mesmo caça! Daí um minuto, após ingerir vagarosamente o copo de leite servido como indisfarçável mau humor do irado barman, Buck Jones sacou os dois revólveres presos à cintura pelo lindo cinturão de couro - trabalhado e costurado com fios de prata do México - despejando toda a fúria das inesgotáveis balas naqueles mal-encarados fora-da-lei. Um a um, a turma do mal foi caindo na presteza de seus tiros, em cena acompanhada de muita fumaça (gelo seco) e borrifos de café preto simulando sangue nas paredes, cena enriquecida freneticamente pelos apupos entusiasmados da plateia, à essa altura sem se conter nos bancos de madeira. A bombástica e drástica passagem foi acentuada pela última intervenção de Zeca do Correio naquela noite, minutos após. Novamente levantou-se, após a fumaça da pólvora se esvair , solenemente meneando a cabeça como se reprovasse aquela infrutífera mortandade dos bandidos , desligados otários que pareciam não ter ouvido sua primeira intervenção de alerta , Zeca apenas arrematou : -Num falei! Neste grande final, então, a plateia veio abaixo. Em diferente época, chamou a atenção de nada menos que a estrela Elizabeth Taylor, num filme colorido feito em pleno inverno de Chicago onde ela adentra abruptamente – embriagada e com raiva - a casa da possível rival, à procura do marido. No filme aconteceu que ela chega à porta, segura a fechadura e se lembra que esquecera o casaco de peles no carro. Penitenciando-se, com a mão direita dá um leve tapa na testa à guisa de lembrança. Foi a deixa. Antes um segundo, Zeca novamente levantou-se e preveniu-a. -Beth, esqueceu o casaco. Está frio demais aí. Quando ela acabou de usar a mão no gesto, agora sincronizado com o aviso, voltou ao carro e pegou o casaco, atendendo Zeca com presteza , como se ele estivesse ali bem pertinho dela. Lógico que essa malandragem também acontecia em outras cidades, sempre vinda de um gozador local, que via, antes de todos, repetidas vezes, o mesmo filme, o que não tira o mérito de termos uma estória própria e a contarmos do nosso jeito. Cada um faz sua parte, como quer e sabe. É o direito legal ou ilegal de qualquer um. Abusem da imaginação e sejam felizes, amém. No gênero que se tornou um dos assuntos preferidos daquele lugar, juntinho à porta do cinema, boêmios célebres e entendidos de arte davam seu recado e cada um inflamava-se mais do que o outro, dependendo da taxa etílica do dia e a excelência dos atores e diretores abordados. Tudo valia, ali. No normal dia a dia, prestes a ficar anormal como sempre. Discursos em cima de caixotes de maçã, agente funerário misturando política com assombrações, picaretas, políticos novos em ascensão, ou velhos e brilhantes mestres da oratória em aposentadorias não aceitas; carimbados chefes de mandiocais de pouca ou muita projeção (estes só em tempo de eleições). Figuras carismáticas que a gente, desde priscas eras, adolescente ou ainda menino de calça curta - podem escolher - ficava melhor calado, espiando, apreciando e aprendendo... Dava-se um diferente palpite - vindo de quem viesse - e era mais um assunto polêmico merecedor de longos embates. De um jeito especial, pregava-se ali uma livre democracia. Hoje, nessa entrada de mais uma bendita festa de Catopês, quem sabe achar qualquer caminho seguro, ao se permitir focar numa simples beleza que ora se inicia, em plena bruma de incertezas? Registre-se a aqui a sequência em vídeo sobre a cidade e o povo de (in memoriam) Maria das Dores Guimarães, que a cada dia acrescenta novas e incríveis fotos antigas ( deve-se realçar a linda e recente postagem sobre Zim Bolão, nosso saudoso técnico de basquete, posteriormente dono de bar e restaurante); acrescido do conhecimento de Virgínia Abreu de Paula (poesia pura) experta no assunto ; do grande músico de raiz Tino Gomes apresentando outros enfoques da origem africana; nas belíssimas fotos do Jornalista Paulo Narciso que nos lembra antigos e marcantes personagens, participantes; do Banzé e sua criadora, Zezé Collares, pelas danças folclóricas ora perpetuadas pelo neto Gustavo, em excelente e inovador trabalho ; ao Dr. Hermes de Paula, autor de uma obra-prima, referencial livro histórico; da visão progressista e clara do meu amigo e pintor João Rodrigues, atual Secretário da Cultura. E a ajuda anônima de uma multidão de catrumanos de fé. A festa continua...Graças a Deus! Parabéns |
Por Flavio Pinto - 26/1/2016 13:51:31 |
Um CD classe A :Vago Universo Flavio Pinto Atenção montesclarense de natural sensibilidade às nossas raízes e que sempre apreciou um pouco(ou será muito?) toda música bem feita com nuances universais e em rara inspiração, tanto na harmonia dos arranjos como na bela interpretação do autor. Além de simples e boa , arte e sentimento para permanecer na cabeceira da rica história musical deste especial sertão de Minas Gerais. Hoje, ás três horas da tarde, hora do Brasil ( às 18 horas na Europa, precisamente em Salamanca ,na Espanha),pela Rádio da Universidad de Salamanca www.usal.es/radiouni ou http://radio.usal.es/ serão tocadas algumas músicas do CD “Vago Universo” do nosso jovem e competente compositor Elcio Lucas. Nas horas vagas, também dedicado professor de português na UNIMONTES. E antes mesmo de ser lançado o CD,o que deverá acontecer brevemente, tanto em Montes Claros como Belo Horizonte. Eu, que já tive o privilégio de ouvi-lo , ouso dizer : obra prima ,imperdível, na minha modesta opinião. Ouçam e confiram. Abraços a todos Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 13/5/2015 10:09:56 |
O OVO & SUAS NUANCES Há pouco mais de 20 anos, curti nostálgicos e consecutivos bate-papos (a maioria nos bares do Mercado Central) aqui em Belo Horizonte, com um conterrâneo do meu pai do Sul de Minas. Ele contava (e eu adorava saber) com riqueza de detalhes, passagens inesquecíveis em Boa Esperança, onde até chegamos a morar um ano no início da década de 50 ,antes de retornarmos a M.Claros, após um tempo na capital do estado. Além de inesquecíveis lembranças da família em remotas eras, fazia questão de me botar (sem trocadilho e com incrível exatidão), em dia com a atualidade e real situação, sabem do quê? Do ovo de galinha! Vejam só. Gastronômica e historicamente falando, assunto que ele adorava discorrer com ares professorais. Era quando, então, diagnosticava, com detalhes e entusiasmo, a situação mundial do ovo: se aquele natural produto ( exatamente naquela hora)estava fazendo bem ou mal à saúde . Quase que só tínhamos isso em comum, mas eu deveras apreciava a repetida e inusitada prosa (o velho amigo era engraçado e espirituoso), em meio, lógico, a ter uma memória de elefante ao relatar incríveis casos de parte da nossa infância. E se, ocasionalmente, encontrávamo-nos em outros lugares, restritos apenas a mero contato visual, à distancia ou mesmo tendo algo ou alguém presente atrapalhando a prosa , de imediato, dava-me um sinal de positivo ou negativo com o polegar. Só eu sabia o que era. E ría sozinho. Se houvesse tempo e lugar para uma conversa (vez por outra até regada a “biritas e acepipes” (como ele dizia), logo vinha a história: -Menino, “tou” comendo, atualmente, uns dois ou três ovos todas as manhãs, pra descontar o tempo perdido. Lá em casa minha mulher me proibiu até de comprar ( reclamava). - - -Quando colocaram o ovo na berlinda condenando-o ao ostracismo, como alimento danoso e prejudicial à saúde. Ou, então, quando se zangava com os preços em alta (principalmente na Quaresma), revelava o oposto: - Agora sou eu é que não como mais aquela disgrama! De jeito nenhum: nem frito, nem cozido. Puro colesterol. Vi numa revista sueca o estrago que ele faz à saúde. - Mas estou sentindo uma falta! E era assim, de tempos em tempos, o ovo virava mocinho ou o pior dos vilões, dependendo das especulações e interesses da mídia , ou de seu estado de humor , dependente, quase sempre, dos altos e baixos da economia local. E logo vinha um único tema diferente nas conversas. - Mas uma “cachacinha”? (Ele mesmo enfatizava!) – Essa ninguém nos proíbe, né? E, completava, perguntando e respondendo de imediato(com água na boca) e fazendo um leve brinde: - Gosto “ mutcho”! Assim, como se fosse noutra língua. - E dava um suspiro de alegria:- Ai! Fiquei sabendo, lamentavelmente, que veio a falecer, na praia, onde aos 75 anos escolheu morar e aproveitar um final de vida feliz nas delícias do sol e mar. Chegou até aos 84. “De causas naturais”, como a classe médica antiga (e amiga) colocava nos atestados de óbito, nos botecos tradicionais ,quando alguém, conhecido e habitual cliente, sucumbia aos males do “figueiredo” ou similar . A família ficava satisfeita, o médico era cultuado, continuava prestigiado por todos e o assunto ficava mineiramente encoberto ao olhar severo e crítico da sociedade em geral. Sumia-se com a incômoda verdade, a bem da memória do falecido. Mas o ovo só lhe fez bem, disseram. Ovos quentes de manhã (caipira, preferencialmente) e talvez, até em outras horas menos votadas(caso tenha vontade) , sem ligar para as pragas ocasionais da imprensa e beatos olhares críticos. Sempre. Aproveito, confirmo e devo até dizer: se ainda tem uma coisa boa (e naturalmente saudável) neste atribulado mundo, é o milenar e saboroso ovo de galinha. De pata, não! Tem gosto esquisito e amargo, apesar de ter quem coma... Que seja cozido, frito, mexido, um sofisticado e afrancesado poché ou mesmo transformado em deliciosas omeletes com recheios mil: de queijo, espinafre ou o escambal , como se diz. Uma verdadeira iguaria l Os ricos comem. Embora escondido (nunca dizem que gostam de ovo, pela falta de sofisticação). E os pobres se regalam. Flavio Pinto o-o-o |
Por Flávio Pinto - 28/9/2014 18:21:12 |
RUA DE BAIXO Eu tenho a impressão que, boa parte da minha infância montesclarense, passei brincando ou perambulando à toa, ali pela ruas de baixo. E como me divertia! Nas primeiras vezes, bem antigamente, levado pelo querido e saudoso Joanir Maurício (casado com minha tia Stella), em visita ao seu pai, Seu João Maurício, e era quando, pela grande amizade e entrosamento entre pai e filho, ambos se divertiam à larga naquele velho Sobrado (eu ouvia quietinho, magnetizado e calado), ao misturarem assuntos do cotidiano com as inimagináveis estórias de caçadas e aventuras dos dois, contadas de um jeito especial e jocoso,provocando gargalhadas gerais . Em mim e quem mais estivesse presente. Seu João Maurício, super impagável, com suas bem humoradas e originais tiradas durante as conversas (a respeito de tudo, coisas que eu até nem entendia, à época) e a visita ainda ficava mais emocionante e engraçada. Sem falar no acompanhamento de um lindo fundo musical de canários da terra cantando nas gaiolas penduradas por toda a casa e a presença olfativa onipresente do fogão de lenha (o borralho,grande e extenso,ia até a parede) sempre fumegando cheiros gostosos, com D.Nair e Alexina preparando algum doce gostoso e me dando raspas e sobras deliciosas,enquanto se coava um café torrado na hora. Cada vez que ia ao Casarão, eu vivia e revivia um filme diferente. Tinha uns nove dez anos. Meus olhos brilhavam, nas histórias. Caçadas de onça, principalmente. E, fora isso, vivia andando solto e feliz por aquelas ruas e becos antigos: sempre gostava de passar em frente ao Armazém de Seu Caribé , comprar balas num boteco ao lado(sabia o nome das maioria das pessoas que morava nas casas vizinhas), jogava bola com ,Tone Abreu,José Leite e os filhos de José Gomes, do Correio,frequentava a casa de “seu” Manoel Viriato ( nas férias,quando os netos, filhos de Bela Oliveira ,Carlos Milton,Ronald e Sandra vinham do Rio de Janeiro,onde moravam),acompanhados da saudosa Angela Zimbardi,prima deles e de uma beleza que marcou presença na história social da cidade. Um acontecimento em quase todos os finais de ano e era uma festa só, ali naquela casa de esquina,em frente à Escola Normal ,nos dias por conta dos preparativos e brincadeiras que antecediam a tradicional ida de todos( no jipe de Pedrinho Viriato) para a fazenda Rebentão dos Ferros,onde passei inesquecíveis momentos de minha vida. Daí,mais pra frente, no decorrer da toada, fiz muitos amigos por ali e adjacências, leia-se Praça de Esportes, onde todos e mais outros colegas e amigos das redondezas nos encontrávamos, quase que diariamente ,na piscinona para treinos de natação. Depois prosseguiu naturalmente,quando estudei na Escola Normal , da terceira-série ginasial em diante até o científico. Foi quando se consolidaram muitas amizades de fé que duraram a vida inteira, até hoje. Uns se foram, outros estão por aí e, apesar não nos encontrarmos muito amiúde (os tais de desencontros chatos que a vida teima em fazer), as lembranças que tenho deles ainda moram no fundo do meu coração e na minha mente. E, nessas alturas da vida, juro que ainda me lembro de todos, acreditem. Sempre lembranças felizes. Só não arrisco a citar nomes, com medo de esquecer alguém, confesso. Mas o livro se encarrega de dar todos os queridos e benditos nomes, com satisfação, garanto, nas fotos (históricas, lindas) e sensíveis crônicas apresentadas. Li e reli várias, senão todas, com o maior deleite. Falei este montão de coisas, das profundezas do meu baú de recordações, para ver se conseguia chegar ao ponto de demonstrar o quanto me fez bem ler o RUA DE BAIXO, e ter, literalmente, parte de meu PASSADO REENCONTRADO, recordando essa importante passagem de minha vida,num local encantado de minha terra. Bem na fronteira da minha casa,separado apenas por uma linda e florida Praça da Matriz ( uma irretocável Igreja , onde cheguei a ser um irrequieto e temporário coroinha) em que tudo acontecia em ritmo de festa e encantamento.Os leilões, as festas de Nossa Senhora e Semana Santa, as procissões, as beatas, os sermões e a doce braveza de Padre Dudu, tudo me voltou à tona : e,last but not least, às voltas e mais voltas das moças bonitas rodeando, interminável e suavemente,seu longo perímetro, nos esperados footings pós festas tradicionais. A gente, já rapazinho, esperava, ansioso, debaixo de uma mesma árvore de Fícus, merecer um único olhar de certa escolhida da hora,que fazia brilhar ainda mais as noites enluaradas daquele lindo sertão. |
Por Flavio Pinto - 12/12/2013 08:53:53 |
Atenção futuros leitores do livro de Carmen Netto Victória, recentemente lançado em Belo Horizonte e Montes Claros e aguardado pelos nostálgicos de uma incrível era de nossa cidade. Como eu já terminei de ler o livro e vivi parte daquilo tudo, falo com mais prazer ainda. Com rara sensibilidade, a autora conta essa inesquecível e fantástica época de criança: amigos,tias doceiras, avós perspicazes e felizes,bem como toda uma peripécia sem fim de sonhos e fantasias que , naquele tempo,só um determinado e esquecido interior do norte de minas oferecia. Um saudável pós-guerra “roliudiano”, cheio de mitos e símbolos importados, misturados com fantasia a deliciosos casos acontecidos em nossa “city”, que até hoje povoam nossas lembranças. Carmen vai cativando o leitor, frase após frase, em 145 páginas de amor e com a“verdade da intemporalidade da criação poética”, como bem definiu a professora Heloísa Aquino Netto de Castro,em sua excelente apresentação nos créditos do livro. Esta preciosidade pode ser adquirida no site da livraria: www.livrariadplacido.com.br , que envia rapidamente o livro e não cobra frete.Também , pela internet ,no site AMAZOM. |
Por Flavio Pinto - 13/4/2012 13:28:13 |
Adeus, Grande Mestre Há tempos não o via. Talvez uns dez anos,quando,ano atrasado me viu passar e me chamou, à porta do Mercado de Montes Claros. E foi aquela velha prosa, saborosa, vinda dum homem possuidor de uma cultura acima de poucos mortais que conheci, pessoalmente ,sobre tudo e todos ,com o mesmo poder de análise .Diferenciado , como se diz modernamente. Deu palpites sobre meu primeiro livro e só lamento que foi embora sem saber que estou lançando outro. Adoraria sua opinião. Se falar que foi diálogo, estaria mentindo. Pois preferia mais ouvi-lo. Sempre. Desde aquele dia ,em 1962, na verde ignorância de meus saudosos dezessete anos , quando cheguei à redação do JMC, passando pela varanda da Rua Dr.Santos (ao lado da casinha de madeira de Tuia,o velho escravo que sempre me reconhecia e sorria) e obtive ( de Waldir também, sorte minha) os ensinamentos e caminhos certos a percorrer nessa inglória e difícil arte de escrever . Hoje talvez ainda eu possa ser inculto e estar muito a desejar como escrevinhador, porém, verde, nunca mais, a partir dali. Perguntei por Konstantin , outro gênio,à época ainda aqui com a gente. Contou as últimas e finalizou; “somos uns sobreviventes, caro Flavio”. Que nunca serão esquecidos, Doutor Oswaldo. Tenho certeza. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 6/10/2011 10:36:23 |
Cowboys de alfaiataria À primeira vista, parecia apenas o que aparentava ser: uma alfaiataria bem simples, no melhor estilo tradicional: um balcão na frente, de madeira, separando um salão de porte médio, duas máquinas singer modelo profissional - uma elétrica e outra de pedal – costurando em alta e baixa velocidade, operadas pelo mestre e hábeis oficiais. Sempre dando conta, com rara eficiência, de todos os serviços normais e anormais que fossem necessários ao bem vestir de uma extensa e fiel freguesia. Vivia-se um glorioso tempo, a profissão de alfaiate estava em alta no mercado: um ofício milenar, criar e elaborar roupas, à mão, não saía da moda. Mais que um ofício, uma arte, hoje, em fase de extinção, pelo crescimento desordenado e forçada industrialização - mal planejadas necessidades - que atropelam tudo que é bom para saciar a sede dos que só vêem vantagens na quantidade e maiores lucros, em desprezo ao bom-gosto e qualidade. Enfim... Tempos modernos. Pregava-se botões, consertava-se calças, camisas e blusões, sempre em dia com a moda de Londres e todo o resto da Europa na confecção de ternos de finos tecidos,da mais cara casimira inglesa ou linho italiano, os mais apreciados pelos mais favorecidos,em sua maioria, pecuaristas (fazendeiro rico, a canção popular já apregoava) numa região onde tudo se girava em torno de gado. No balcão, revistas nacionais e estrangeiras. Lembro-me - esparramadas em cima do balcão- da life e a indefectível taylor, esta, considerada a bíblia mundial do alfaiate. Ambas escritas em inglês ( a life tinha uma versão em espanhol), difícil para uns e impossível para outros, embora ali na alfaiataria ninguém ligasse : as fotos diziam tudo que se queria saber. A alternativa mais econômica era o amarelecido brim cáqui para os menos afortunados, os remediados que ainda queriam ficar ricos. Estes, em maior número, faziam fila nas compras e na prova de roupas, atendidos com o mesmo esmero e presteza pelo mestre, oficiais e assistentes. O resistente brim era o tecido mais requisitado: talvez pelo baixo e atrativo preço ou mesmo - sábia e praticamente- pela quase infinita durabilidade (se existia o jeans, ainda estava nos seus primórdios na América do Norte), mais adequado aos poeirentos caminhos de terra . O que poderia haver de tão bom e interessante no interior de uma alfaiataria, para deixar um garoto de oito, nove anos - diariamente, naquele intervalo após o término das aulas e a hora do almoço - ficar sentado num velho banco de aroeira nos fundos ,prestando atenção a tudo e a todos e se divertindo à larga, mais ainda do que ficar plantado na porta de “Ducho” trocando revistas em quadrinhos ou jogando” tapão” com figurinhas do sabonete Eucalol ou Balas América? Como se fosse um permanente festival de Cannes ou Gramado, ali dentro, o papo era um só: cinema. E numa especialidade que encantava qualquer criança da época: faroeste americano. Histórias de cowboys, tanto os personagens como os atores, índios célebres e não menos cavalos, como o famoso Trigger, de Roy Rogers e a égua Beleza, de Billy Elliott. Da cidade, algumas (raras) fofocas sociais e, de vez em quando, algum comentário sobre uma resenha ou resultado de uma partida de futebol. Cassimiro e Ateneu, seguido de Vasco e Flamengo. Tinham a preferência. Atlético e Cruzeiro era coisa de gente de Belo Horizonte. Quanto ao assunto principal, parecia que se estava num outro mundo, com todas aquelas figuras famosas sendo comentadas e esmiuçadas nas suas interpretações de verdadeiros e legendários machões, personagens conflitantes de um oeste americano bravio, cantado e decantado no mundo inteiro, no magnetismo de seus duelos ao por do sol, rapidez no saque dos revólveres e precisão na pontaria dos rifles “Winchester”, na eterna guerra e devastação de primitivas e inocentes nações indígenas. E foi assim em toda a América, tanto do norte, como Central, ou do Sul – os livros de história contam tudo, não há escapatória - embora, naquela época, muita gente acreditava ser uma posição politicamente correta. Quem matava mais índios era considerado herói e o povo aplaudia. Buffalo Bill, mais famoso e falado, era cortejado e fez fortunas anos depois em circos de cavalinhos. Onde ele está hoje? Tem que se perguntar p’ros os padres, seja crente ou não. Mas isso, como diz o outro , é outra história... E eu ficava ali, sentado, escutando, sem dar um pio, pois não queria perder nada. Certo oficial, um tanto diferente (acho que tinha um olho só) olhava de lado para enxergar a linha ser enfiada na agulha – usava um lindo dedal de prata trabalhada - volta e meia dava uma parada no que fazia e dizia: “ Esse Allan Ladd num tem jeito mesmo. Deu agora pra fazer filme policial e só vive apanhando. Outro dia,mesmo,um gangster mal encarado deu-lhe uma surra num beco cheio de latas de lixo, que se não fosse aquela lourinha que cuidou dele a noite inteira eu ia até tomar raiva do distinto. Porque não volta a fazer como em “Shane” dando porrada em todo o mundo e matando ,com facilidade, Jack Palance?”. Outro assistente, dos mais novos e entusiasmados, não se continha e entrava logo na conversa. Mais chegado em Gary Cooper, lembrava: “pois é com Guéuri (olha a intimidade)- nunca acontecia isso. Como Sargento York, matou e prendeu centenas de alemães, de índios nem se fala, até aqueles do Canadá, que andavam nus no gelo,sem se congelarem. Mas bom mesmo foi acabar com a raça daquele Lee Van Cleef ( tornou-se cowboy famoso em faroestes/ espaguetes italianos, anos mais tarde) e seus amigos em “Matar ou Morrer” e a realizar, ainda,a façanha de beijar na boca Grace Kelly. Será que comeu?...Antes do príncipe?”. Todo mundo ria e trocava olhares significativos (eu não atinava por que) e ficava esperando a opinião do mestre alfaiate, que a todos sempre ouvia com atenção e soltava sábias e ponderadas palavras sobre o mesmíssimo assunto, no decorrer do expediente. E, de leve, ele acabava sempre falando do mesmo artista: Randolph Scott, legendário personagem de filmes B, comerciais,para consumo fácil, mas de boa feitura. Para ele, o melhor, o mais macho e que nunca apanhou dos bandidos. Na cara, nem pensar. A prova estava naqueles repetidos e previsíveis filmes de baixo orçamento (em sua maioria, preto e branco) estreados no sábado à noite, antes do seriado começar. O Cine São Luís (para o grande mestre alfaiate, o templo mais sagrado da cinematografia) era por ele assiduamente frequentado, principalmente nos filmes de Randolph Scott. Lógico, deve-se esclarecer a bem da verdade: o bom Germano, o mais tradicional, simpático e conhecido porteiro de cinema da cidade, além de seu amigo era também um especial e querido freguês que sempre lhe franqueava, agradecido, o ingresso para sessão dos sábados á noite: lógico, também pela amizade e gratuitos/ sucessivos cerzimentos de roupas da família,principalmente nas amarrotadas e esgarçadas calças curtas de seus meninos,que viviam jogando pelada o dia inteiro no Larguinho do Rosário. - Randolph arrasa, sempre afirmava o mestre-alfaiate. - E, além disso, é educado e bonzinho - todos balançavam a cabeça, aprovando. -Só matava quando não tinha jeito. Contentava-se em desarmar o vilão com um tiro certeiro na mão. O revólver pulava longe. E aí, dia após dia, os comentários entusiasmados se multiplicavam e a orelha daqueles velhos personagens devem até ter coçado algum dia, tanto era o aumento e infinitas ramificações biográficas sobre suas carreiras. Mas, como tudo tem um porém... Um dia... O tal porém veio de um filho destes fregueses ricos que estudava nos Estados Unidos.O pai, orgulhoso, subia sempre a sua bola, sempre omitindo o som de erre aspirado do agá no início da palavra. - Arvardi, abria a boca, todo sorridente. -É lá que o menino estuda. As más línguas afirmavam que era uma escola de contabilidade nos arredores de Nova York. Bom também. O rapaz ficou uma manhã inteirinha provando e aguardando o finalmente de um terno de casimira inglesa para a formatura, que seria no fim de ano. Na espera, sentado no banco de aroeira, começou a folhear as revistas (pelo menos isso aprendeu em quatro anos de América) lia e falava em inglês fluente, constatado e garantido pelo professor Correinha, renomado professor do idioma de Shakespeare e ,nas horas vagas,funcionário do Banco do Brasil.Saudoso e querido colega. Uma especial reportagem, que todos no recinto, inclusive o mestre alfaiate, gostavam de ver e rever (várias fotos de Randolph Scott todo alegre e sorridente ao lado de Cary Grant numa casa de praia, ambos de calção de banho e desnudos da cintura prá cima) provocou uma irada reação no rapaz letrado. - Mas que pouca vergonha, dois homens erados destes, morando juntos e dizendo que as mulheres não estão com nada e nada se compara a sua felicidade atual de ser um casal morando sob o mesmo teto. Vê se pode? A estupefação do jovem (hoje em dia,com certeza, política e socialmente incorreta) ecoou nas quatro paredes do salão, as máquinas de costura pararam de matraquear e as linhas teimavam em não enfiar nas agulhas: o silêncio longo que se seguiu foi mais que sepulcral, se é que assim pode-se dizer. -Como é que é? Quase que em uníssono. Geral. Do mestre, do oficial e até de dois fregueses tradicionais, sempre ali, como eu. (E Zeca do Correio, já ia me esquecendo: foi ele quem me levou: acho que um irmão do saudoso Lazinho Pimenta era seu amigo e trabalhava lá. Realmente não me lembro dos nomes, muito tempo se passou, mais de cinqüenta anos e não estou com essa bola toda de memória que gostaria de ter. Talvez alguém possa esclarecer. Será bem-vindo) Incontinenti, todos vieram ver de perto e o futuro formando em contabilidade americana não se fez de rogado: traduzia alegremente, com sabedoria e fluência, palavra por palavra. E, como se fosse um prédio caindo,tijolo após tijolo, a reputação de machão de Randolph Scott, seguido de Cary Grant (que lá não tinha tanto prestígio assim) foi despencando,despencando até chegar ao rés-do-chão. Foi quando, mais que calmamente, o mestre alfaiate sentenciou: -Querem saber de uma coisa? Não se fala mais dele aqui. Não quero nem ouvir falar neste Randolph Scott ou seu belo amiguinho. - De hoje em diante só assistirei filmes de Gary Cooper e Rock Hudson! Naqueles idos de cinquenta e poucos, o galã Rock Hudson, forte e bonitão, começava a despontar em Hollywood como cowboy e galã super macho. Sempre com Dóris Day a tiracolo, à coté,como diria Lazinho... Abraço a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 1/9/2010 13:03:48 |
TEMPOS MODERNOS Com esta modernidade toda que apareceu de uns tempos para cá, de invenções pra melhor (outras pra pior, há controvérsias), muitas coisas antigas acabaram ficando demodées, como diria o saudoso Lazinho Pimenta (sempre me lembro dele se modernizando). Até o mais ultrapassado já deu o braço a torcer para alguns melhoramentos, embora com uma ligeira extrapolação. É que uns - indo ao pote com extrema sede e afoiteza - confundem valores e idéias subliminares e engazopados nesta pretensa novidade, abusam (mesmo sem querer, querendo) da boa vontade dos amigos, conhecidos e até desconhecidos. Trazem à tona antigas máximas e orações santificadas de diversas religiões e igrejas como se fossem verdadeiros e últimos lançamentos da mídia religiosa mundial, mas que, na verdade, já foram publicadas em séculos passados (os velhos Almanaques Biotônico Fontoura e Bertrand que o digam) e nossos pais e avós já se deliciaram à exaustão com os mesmíssimos textos de carma e correntes. E até, pasmem os novos cibernéticos, já os transmitiram para nós, meninos e meninas de outra era, na tentativa de nos direcionarmos ad infinitum para o bem eterno , Deus te abençoe per secula seculorum, amém. Isso, eu e toda uma geração feliz já ouvimos até enjoar. Com os olhares entediados virados para cima (é verdade e deve se dizer), vendo muriçocas voarem livres e soltas pela sala. Doidos para sair e brincar na rua. Coisa de ontem, anteontem e tresantontem, os velhos de guerra entendem. Mas, justiça seja dita e feita: todo o mundo faz o que quer de seus e-mails. Estão no direito, quem poderá dizer que não. Embora seja bom saber que este direito torna-se perdido quando entra num espaço de outrem, passando uma barreira que se chama privacidade e, o que é mais importante, livre escolha do destinatário, do que ler e do que quer ver. A gente entra no cinema e assiste ao filme que deseja. E paga. Como na internet também se paga. Dirão então: “se não quiser abrir, não abra”. Mas, e se um dia vocês - apenas, de coração - perguntarem por mim, ou como estou indo, eu nunca poderia saber... Abraços a todos. |
Por Flavio Pinto - 18/8/2010 11:36:30 |
DE HOJE PARA ONTEM Como se fôssemos viajantes na máquina do tempo que o inglês George Wells criou há 110 anos, fomos resgatados de um mesmo lugar do passado (embora nem tão longínquo assim). Tínhamos deixado a bela e antiga nave chamada JMC, primeira e única, para reparos numa oficina sideral e nos transportamos para esta nova máquina, cibernética e com velocidade da luz , continuando assim nossa gloriosa e (in) descritível viagem pelo fantástico mundo da comunicação. Com o sagaz piloto Paulo Narciso - intrépido viajante intergaláctico e intercontinental - no comando desta nova nave de nome Montesclaros.com , nunca caímos em buracos negros, profundos ou mesmo rasos e sem volta. Sempre nos sentimos seguros para darmos conta do recado, cada um em sua especialidade, seja ela da verdadeira história ou sutilezas da alma humana, com sinceros relatos do presente real ou do surreal fantástico e improvável. E de tudo o que acontece e quase aconteceu, também – desde o início – na vida diária e antiga desta cidade que só pode ter sido criada pelos deuses num dia de muita inspiração. Salve, salve , então, Oswaldo Antunes , Haroldo Lívio e Waldyr Sena , companheiros de odisséia. Três mestres, juntos novamente, acompanhados deste eterno aprendiz e amigo. E a todos que vieram: ou como membros efetivos da tripulação e, outros mais, especiais espaciais passageiros, tão ou mais importantes que foram para o sucesso desta maravilhosa viagem, um grande abraço. Salve Alberto Senna, José Prates, velhos e competentes tripulantes, e o Bala, que embora não tenha navegado no primeiro foguete, o faz com rara maestria no segundo. A todos, obrigado. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 1/6/2010 14:01:58 |
JUNHOS PASSADOS Junho.Segunda metade do século passado. As noites frias pediam blusas e cobertores para a noite. Tempos inocentes em que, ainda , só velhos cobertores - com cheiro de naftalina - saíam dos armários. Tempo de ouvir pelo rádio a pátria amada ser, pela primeira vez, campeã de futebol e por isso, ser mais amada ainda. O mundo de violência, atentados, assaltos, sequestros e todas as coisas ruins do mundo estava muito longe (graças a Deus e às rezas de todas as tardes na Matriz de Nossa Senhora e São José) - mais ou menos a milhares de quilômetros desta velha e alegre cidade. E as guerras , marca registrada do primeiro mundo em todas as eras ( defendida por muitos e por todos os tempos como sinal vital de educação e civilização(sic), sustentáculo da economia principalmente na venda de armamentos, a mais forte fonte de renda), locais ou mundiais - em qualquer lugar longínquo e incerto do planeta - estavam apenas nas rádios e fotos das revistas. Deus te salve ó Casa Santa e mais ainda à força e simpatia dos Aliados (contra o vilão alcunhado de Eixo, cujos integrantes viraram novamente mocinhos, pela força do coração e homens de boa vontade do mundo inteiro) nossos queridos “muy amigos” americanos, ingleses, franceses ( por muito tempo os russos foram cortados. Mas, já voltaram, como amigos também , depois que o dinheiro falou mais alto e conseguiu-se comprar e acabar com o comunismo) , transmitiam segurança eterna e sabor de vitória para todos nós, terceiros mundistas ignorantes , eternamente crédulos , de carteirinha, amém . Generais e comandantes de nomes impronunciáveis eram nossos grandes heróis – fora Superman, Flash Gordon e Capitão Marvel, rrs - rivalizando-se até à paixão pelos nossos craques imortais de jogadas e dribles sobrenaturais (ora viva e reviva o grande Nelson Rodrigues). Lado a lado com estes craques eles também faziam parte dos nossos álbuns de figurinhas. Como também a figurinha super difícil das Balas América , a Bomba Atômica (ninguém completava o álbum sem ela ) e seu cinematográfico cogumelo de fumaça. Jogada em Hiroshima e Nagasaki, quem falava das centenas de japoneses mortos era politicamente incorreto. Ou de comunista, comedor de criancinhas, o sermão sempre era o mesmo, nos púlpitos. Mas, pela justiça e vontade de Deus, as linhas tortas foram entendidas e a verdade apareceu no futuro, calando bocas infames. Nos jornais falados e telas de cinema, mostrados repetidas vezes, à exaustão , a gente vibrava de patriotismo nas marchas e dobrados dos documentários enlatados ufano-americanóides (como se fossem nossas próprias músicas de raiz), apresentados antes do nossos filmes de cowboy-capa-e-espada das inesquecíveis matinês de domingo . Mas, se já cantávamos e assobiávamos de cor o “Oh! Minas Gerais”, que nasceu e morrerá como uma valsa do velho mundo, quem vai se importar com um detalhe deste? Como diria Robin, parceiro do Batmam : “santa inocência”. No entanto, éramos felizes e sabíamos (homenagem ao bom livro da rapaziada)! Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 13/5/2010 12:35:37 |
CONVERSA DE TREM DE FERRO (Para Alberto Sena e quem mais gosta de trem) Com muita saudade e não menos prazer, recordo alguns primeiros e alegres anos de minha vida, tentando, talvez,” a bem das gerações contemporâneas que precisam conhecer nosso passado (como diz P.Narciso)”, ir bem fundo nas minhas lembranças. Da mais tenra infância, acredito, embora muita coisa já nos fuja. Também meio século se passou. Ufa. Nós íamos a pé pra estação - distância de apenas alguns quarteirões - a família toda, sempre acrescida de uma ou mais tias solteiras ( Vivi, Tetê e Stela) sempre presentes nestas viagens para B.Horizonte, fazendo companhia e ajudando minha mãe a tomar conta da gente. O que não era fácil, diga-se. Embora, que nem James Bond (talvez um pouco menos), elas também tinham licença para matar, ou melhor, beliscar. Suaves beliscões, nem tanto. A gente, então, as respeitava, mas...os braços viviam roxos. Rrs. Quanto tinha muita bagagem, mandava-se um recado pra Seu Matias Peixoto – ali na rua Mangabeira, pertinho da casa de minha avó na Afonso Pena-, carregador de malas oficial da Rede (pai de Tu, Vicente Pezão e José Matias, meus amigos, craques inesquecíveis do futebol montes-clarense) e ele passava lá, na hora certa, com sua garbosa e lustrada charrete de pneus de sedam. Sério, no alto de seus cabelos brancos, sempre, carinhosamente, nos convidava pra sentar junto dele na boleia. E a aventura começava a partir dali, no trote do cavalo (ou burro, não me lembro) pelas ruas de terra da velha Montes Claros. Para nós era como se fosse uma verdadeira carruagem do tempo dos príncipes e contos de fadas. A linda e antiga estação era uma festa. Passageiros, maquinistas, chefe de trem, lá todos se conheciam. As partidas de trem sempre eram um grande acontecimento. Os pais conversando e fumando alegremente no saguão e plataforma (naquele tempo o cigarro incomodava menos gente), os meninos correndo e dando canseira às mães e tias; o indefectível cheiro de carvão pairando no ar , vindo da fumegante locomotiva a vapor à frente do comboio, fora da plataforma de embarque. A gente não se continha e descia até os trilhos para vê-la de perto. E lá estava ela, a famosa Maria-Fumaça, na sua mais completa e lendária magnificência, parada e ligada, soltando altos e alternados suspiros de fumaça branca, ao exato tempo / momento que o suado e esforçado foguista jogava-lhe, contínua e lentamente, sucessivas pás de carvão dentro da fornalha . Esta alternância, com o som chiando no vácuo, provocava-nos o maior susto e, ao mesmo tempo, nos maravilhava de encantamento. Logo, logo, chegavam as tias, grudando nosso braço para voltarmos à segurança da plataforma. E tome beliscão. Quando o trem partia, devagar, não saíamos da janela, cabeça pra fora, apesar de mil alertas do perigo das faíscas ocasionais. Os avisos não faziam muito efeito: só sentávamos após a última casa ter -se transformado de vez numa minúscula casinha de presépio, desaparecendo no já distante e belo horizonte montes-clarense. Sentados nas poltronas, uns em frente aos outros, abria-se a primeira panela, bem vedada num caseiro e branco pano de prato, contendo uma senhora farofa de galinha, pedaçuda e bem temperada( de lamber os beiços) feita por minha vó, Finita: as tias e minha mãe comiam de” capitão”, os bolinhos enrolados na mão com invejável perícia. A meninada comia de colher mesmo. Nunca aprendemos a enrolar aqueles bolinhos na mão, sem deixar a farofa cair toda no chão. As cidades se seguiam, dolentemente: Bocaiuva, Granjas, Dolabela e Augusto de Lima, onde o trem parava e eram apresentadas aos passageiros as mais variadas e gostosas mangas do mundo. Rosa, comum, ubá, espada, pela janela os meninos juntos aos trilhos ofereciam e vendiam um saco delas, inteirinho, a troco de uns poucos mil réis. Era manga para estufar a barriga de muito glutão durante toda a viagem e ainda sobrava para levar pra casa. Sob o olhar complacente do Chefe de Trem, comíamos e nos lambuzávamos daquelas delícias, atirando as cascas e caroços pela janela. Hoje em dia, talvez os mais afoitos e críticos nos achassem pouco ecológicos, mas já sabíamos que um outro ser qualquer, passarinhos ou até mesmo um gambá, iria se fartar à larga de nossas sobras... Corinto, Curvelo e Sete Lagoas. Estávamos quase chegando. Mais algumas horinhas e... Belo Horizonte. Aí um velho bonde nos levava a até a rua do Ouro 317, Serra, esquina de Aguapeí. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 29/4/2010 10:12:24 |
A GRANDE VIAGEM DOS CHATOS Pelo telefone, uma voz que não ouvia há muito. Grande surpresa! De quem mais, senão de um velho amigo desaparecido (agora ressuscitado), grande personagem deste sertão do pequi: O famoso urubu Asclepíades, cavalheiro de alta estirpe, mui negro e famoso, retornando com toda a força de sua uruburlesca figura. Humildemente, pedia somente uma coisa. Aliás, pedia não, solicitava, com aquela fleuma só encontrada em recantos bem alhures, como sempre dizia seu ex-proprietário, Henrique Chaves. Que não se dissesse nada a ninguém do que aconteceu durante o tempo em que esteve fora: misteriosas histórias a partir de uma complicada fuga (com direito a sofrido asilo político) - e ai, talvez (com seu beneplácito e aquiescência), poderiam ser esclarecidamente relatadas num futuro bem próximo. - Depois que Fernando Gabeira contou as dele, as minhas perderam a graça – ponderava com ar de sabedoria, dando por encerrado o assunto. Mas acabou contando a última, após várias bicadas numa velha Santa Rosa que nos acompanhou pelo resto da noite, num de seus vários escritórios locais (botequins, caso alguém esteja chegando agora). E falou, falou... Foi em Cannes, quando gozava merecido descanso, dando balanço na vida, após as tais peripécias não contadas. Sem mais delongas eis a história, de sua boca, aliás de seu próprio bico: “ De férias, na linda praia francesa, de companheiro apenas meu surrado terno preto de toda a vida, de repente, soa, por perto, uma voz familiar: -Ora, ora se não é o grande conterrâneo aí, o urubu Asclepíades! Uma entonação clássica dos montes, montes claríssima, a gente podia até imaginar quem fosse, sem medo de errar. Já há algum tempo ouvindo somente voz de gringo ao redor, imaginei-me sonhando. A voz continuava, insistente. Olhei então na direção e quase caí de costas: - um montes-clarense autêntico, meu prezado, daqueles antigórios, que a gente já enjoou de ver nas vizinhanças da rua Quinze e bar de Zim Bolão. -Em Cannes, meu chapa, fora de temporada, ter que deparar com essa figuras e outras mais, como se abrisse as portas do passado misturado ao presente da cidade e aquelas velhas fotografias pregadas nas paredes dos próprios municipais adquirissem vida e saíssem todas lépidas e firmes das molduras... É mole? E, ainda por cima, reduzidos trajes de banho, óculos escuros, chapéus hilários/esvoaçantes, drinques espertos na mão e... Aprontando. Sai por ali olhando aquela bizarrice toda. Só dava eles. Não aguentei a mórbida curiosidade e tive que perguntar o porquê. Era uma caravana de turismo em volta pelo mundo, três ônibus rodando pela Europa inteira, de graça. Por conta de quem, não fiquei sabendo. Disseram-me apenas que era por conta de uma tal Comissão. Quanto ao motivo, simplesmente desconversavam, mudando de assunto, ficando por isso mesmo. Não insisti, mesmo porque me convidaram para ir junto. Fui. Talvez mais tarde, quem sabe, eu descobrisse tudo, pensei. Arrumaram-me um leito especial – em cima das malas – até agradeci tanta atenção. No ónibus que fiquei havia duas madames, as poderosas chefas. Não se fazia nada sem que elas quisessem ou mandassem. Logo na primeira parada botaram o trocador pra fora, só porque ele deu uma trepidante gargalhada quando uma delas, afoitamente, tentava abrir a porta do ônibus, puxando-o com toda a força e não aceitando palpiteis de ninguém quanto ao verdadeiro sentido da palavra PUSH afixada no vidro da porta do ónibus. Por sinal, inglês. Ela insistiu, insistiu, até que quebrou a fechadura e a maçaneta. Esta, exibida - triunfantemente – para todos os passageiros. Lógico, mantiveram-se, sabiamente, em silêncio. Talvez pelas lembranças do recente affair trocador versus poderosas. O ónibus seguia viagem. Como conversavam entre si! Falavam ao mesmo tempo. Sem pausa, ponto, vírgula, silêncio, ou mesmo uma simples e natural respirada. Cada qual, o mais alto que podia. Um contava caso para o outro que, por sua vez e ao mesmo tempo, contava um diferente para um terceiro, que já estava ouvindo anteriormente o primeiro interlocutor. Total desentendimento, pra não dizer um colossal e senil descalabro. Os mesmos assuntos desencontrados e repetidos amiúdem em qualquer contemporânea reunião social que se preze: “Venturas mis e nenhuma desventura, principalmente dos parentes contra parentes e entes queridos ; as melhores viagens, os melhores carros; o eterno se gabar de querer ser o mais o mais malandro; histórias em que sempre a outra parte levava a pior e por ai vai, todos conhecem esse velho e surrado tema: quanto mais chique...” Só que ali não tinha plateia para um filme (que nem sequer poderia ser realizado): todos os protagonistas eram mocinhos ou mocinhas, não havia lugar para bandidos... Menos eu, E o que fiz? Como se diz, sartei de banda. Fui para o segundo ónibus, na perspectiva de melhores momentos. Eu queria apenas passear com tranquilidade. Neste carro, cheguei mesmo a me alegrar. A princípio. Fazia-se um silêncio completo. Pelo menos isso, pensei, ai os meus ouvidos se refrescam. Foi quando senti o lance: ninguém conversava por um simples e único motivo. Estavam de mal, pasmem. Tipo Belém, Belém... Completamente brigados, não se falavam há anos. Só dois se comunicavam dentro daquele ónibus: o motorista e o trocador, exclusivamente. Além das funções normais, ainda serviam de leva-e-traz de recadinhos entre os ocupantes. “ Fala com ele que eu falei, mas não fala que fui eu!” E foram eles mesmo que me contaram o que aconteceu a seguir, ouve só. Quiseram eleger o presidente da viagem, minutos depois da partida. Alguém que - mesmo se não fizer nada (pela absoluta falta do que fazer) – pelo menos possa usufruir do prazer de se ter um cargo importante. Voltaram a se falar - por pura conveniência – e fizeram a campanha dentro do ónibus em movimento. Teve até longos discursos e comícios relâmpagos. Apresentaram-se os candidatos, optando-se por uma eleição diferente, bem moderna (inusitada), onde todos eram candidatos, Apenas a consciência e a cabeça de cada um escolheria o melhor. Não deu outra: terminou empatada. Todos votaram em si próprio. Então, o pau quebrou. Brigaram de novo, não se salvando nenhum. Todos de mal, como dantes. Eu, como queria apenas a viagem grátis e um leve turismo, sem confusão, passei imediatamente para o terceiro ónibus. E qual não foi o meu espanto quando vi o que vi! Dentro do terceiro havia somente um passageiro, sentado à larga, na maior folga. E logo quem, senão aquele chato mais exclusivo deste meu sertão da carne de sol, o mais famoso, o maior de todos, cujas proezas nacionais e internacionais já foram tão contadas e repetidas que torna-se até desnecessário dizer o seu nome? E ele, antecipando-se a qualquer coisa, respondeu de pronto, sem que lhe fosse perguntado alguma coisa. (Por isso e por outras ele foi sempre o maior: sempre respondeu ao que nunca lhe perguntaram). - Ó, meu caro (com aquele conhecido ar superior, genético), por aqui ninguém me aguentou. - - Nem o chofer, olhe só... E deu aquela velha e enigmática risada de lado, apontando para o veículo. Quando olhei direito vi que o ónibus ia sozinho pela estrada afora, apenas ligado no piloto automático (especial para Bus, dizia o manual do fabricante). Eu, como sou do sertão e nunca ouvi falar de piloto automático para ônibus, pulei fora e, do meio da estrada, só deu pra ver, num relance, os oito pneus se enchendo, enchendo, até estourar completamente, a poucos metros dali. Não suportaram a alta pressão daquela chata presença.” NOTA DO AUTOR: Não se deu nome aos chatos e, principalmente, ao último, pelo simples motivo de se deixar à imaginação e vontade do leitor – que, certamente, conhece mais do que ninguém seus chatos particulares – a liberdade da escolha do seu próprio e maior de todos. (Texto publicado em outubro de 1980 em “ O JORNAL DE MONTES CLAROS”) |
Por Flavio Pinto - 31/3/2010 19:21:23 |
UMA PATRULHA MOTORIZADA (Para Gonçalves (MSG 56743) Como participante ativo dessa turma de atiradores citada por você (menino de calças curta nessa época você não poderia saber mesmo) sinto-me na obrigação, compelido mesmo, a entrar, ¨”de com força”, no seu caso. Não o conheço pessoalmente, mas pressinto em você uma alma boa por trás da mensagem. Espero que não se importe com esta intromissão. Além de Lindemberg e Zé (Carlos) Alves tinha mais gente nessa patrulha dos atiradores, naqueles idos de março/abril de 1964, mais para primeiro de abril do que 31 março. Deixa pra lá... O pequeno e grande Bill, cracaço do Ateneu por muitos anos, Odorico Mesquita, Ricardo Laughton, Aldoizio Costa e eu. Turma das antigas, boa pra valer. Somos amigos até hoje – um pouco afastado de alguns, é verdade – mas sempre com as melhores lembranças de todos. E mais um, o Sargento Villar – baixinho invocado – gente fina demais. Jogava basquete com a gente na Praça, e bem. Só não enterrava por óbvios motivos. (Aí também não, né, gente). Não tenho muita certeza se o sargento ia conosco em todas as incursões ou se usava outra viatura ( aí só Berguin pra lembrar), cedida pelo batalhão de polícia. Com Lindemberg no comando (tinha sido promovido a cabo: bem esperto, vivia no pé de Lazinho, solicitando, com êxito, botar o nome do Chefe dos Sargentos - o inesquecível Sargento Conca - e senhora, na coluna social do JMC, onde era repórter geral. Rrs) , fizemos parte de uma incrível patrulha motorizada. Tipo Exército Brancaleone, quem é meio cinéfilo sabe. Talvez a única viatura na história antiga do glorioso TG 87. Se houve mais alguma motorizada em outras épocas, desconheço. Pelo menos ninguém me contou, até hoje. Aboletados numa possante camionete (uma linda e esverdeada DODGE, modelo 1951),Ricardo Laughton sempre dirigindo, por direito e herança. Até que ficávamos com uma ponta de inveja, mas o carro era do pai dele, Seu Lindolfo, como reclamar? E, a gloriosa patrulha rodava a cidade de ponta a ponta, pronta para a ação. Que nunca aconteceu... Era com se fosse um similar da americana e pomposa SWAT , mas humilde, e põe humildade aí, armados apenas com uma velha baioneta na cintura, entusiasmada e cheia de testosterona e juvenil irresponsabilidade, com muita vontade de aparecer qualquer tipo de confusão, baderna, crimes hediondos ou até mesmo um pequeno levante popular (ou contra a favor), para podermos testar nossa grandiosa força e poderio (sic)... Infeliz, ou melhor, felizmente nunca aconteceu nada. Deus protege os inocentes e os tontos. Daí que gastamos nesta empreitada litros e mais litros de gasolina, rodando inutilmente pela então pacata cidade. A maior parte na zona boêmia. Esse pedido do peculiar trajeto teve aprovação unânime, diga-se. Ricardo Laughton(chofer) Lindemberg e eu na boleia. Eu já era ajudante de cabo, Berguinho me nomeou. Depois vim a saber que não existia este posto no exército. Odorico, Aldoizio, Bill e Zé, lá atrás na carroceria, coberta com lona e com dois bancos pra carregar peão. Reclamavam paca, não sei de quê! Mas era uma festa quando entrávamos nos cabarés. O povo e as raparigas presentes riam mais da gente do que ficavam com medo. Todo mundo era conhecido de todos. Não tinham o menor respeito, aqueles félas... Uma vez, numa dessas incursões, no Cabaré de Anália, Dim Canga (irmão de Murilo e Julinho Boca de Fogo, meus vizinhos) cumprimentou-me efusivamente de cima do palco, no microfone, em meio uma bela canção (salvo engano, “Alguém Me Disse”, famosa na voz do falecido Altemar Dutra). Fiquei todo cheio e honrado. Nós, enlevados pela bela interpretação de Dim, com sua maviosa voz rouca, nem percebemos que o Sargento Villar tinha adentrado ao salão .Ele viera, a chamado oficial , prender “Crioulo”, elegante malandro das antigas ( só vestia terno de linho Ésse120) irmão de Anália, campeão de sinuca da cidade e mestre de capoeira nas horas vagas, que tinha dado um tiro ( e errado a pontaria) numa rapariga, em outra zona. Mas ela deu queixa assim mesmo e armou-se a confusão. Eu conhecia bem Crioulo. Desde os meus tempos de adolescência brava/rebelde e o admirava pela sua destreza com o taco. Tempo de matar aula e passar o dia e a noite, clandestino, num velho salão de sinuca que esqueci o nome. Sei que tinha um certo Seu Augusto, que tomava conta das mesas e um reservado de Pif-Paf nos fundos Ele era meio (ou melhor, totalmente) ranzinza e neurastênico, mas gostávamos (minha turma) dele. Sempre fez vista grossa para a nossa presença de menor de idade. No Cabaré de Anália fui o primeiro chamado - por este conhecimento do bas-fond - pra localizá-lo no recinto.E o fiz, cumprindo ordens, embora até meio sem graça, confesso. Crioulo, como sempre, estava bem à vontade, dançando puladinho com uma linda baiana (que eu conhecia), rodopiando como um príncipe, bem no meio do salão. Ele parou, olhou-me nos olhos e perguntou onde estava quem queria prendê-lo. Quando viu o sargento, que parecia ainda mais baixinho ao longe, na porta do Cabaré, dirigiu-se a passos largos para lá, já com um ar maroto, de deboche, no rosto: - É só esse ai? E mais quantos? - Bem na frente do sargento. Só pensei, viche Maria! Por alguns segundos fez-se um silêncio geral. Zé Tôco segurou como pôde as baquetas e Lausinho parou de fazer aquela careta de sempre quando tocava (ele fechava um olho durante todo o tempo, talvez viajando na música) e encostou o violão na parede. Dim Canga foi lá pra dentro tomar uma, de leve. O Sargento Villar só fez meter a mão no coldre preto e tirar uma 45, automática, de cabo de marfim, de uso somente das forças armadas. A maior e mais bonita máuser que já vi. Colocou - a (o gatilho destravado, seguro apenas pelo polegar) na boca de Crioulo que ficou engasgado e totalmente pálido, repentinamente. Pensei de novo: vai atirar! Só não tapei as orelhas porque não pegaria bem em público. Ridículo demais para um guarda armado, membro de SWAT. Meio escalafobética, mas SWAT. E o Sargento levou-o, com a 45 enfiada na boca, branco como cera e com os olhos meio esbugalhados, até a viatura, estacionada na rua, do lado da Praça de Esportes. Um pouco depois, lá, acalmados um pouco os ânimos , a gente conversou com o Sargento, dando uma força pro Crioulo (até hoje não sei seu nome), falando de suas qualidades e habilidades no pano verde, Anália fez valer a sua posição de dona do Cabaré mais famoso da cidade e o sentimento acabou falando mais alto.Resolveu-se tudo. E com bastante finesse. Ninguém foi preso e ficou por isso mesmo. Próprio da velha Montes Claros. Todo mundo, ricos, pobres e remediados, era amigo. Dez minutos depois, disseram-me, o Cabaré reabriu com tudo a que tinha direito. Música, bebida, cigarro e raparigas. Á vontade. Embora um pouco nauseante pelo cheiro que ficou no salão, oriundo, possivelmente, de resquícios naturais aparecidos nos fundos da calça de linho branco do campeão. - Puro Amarelo ouro com verde-escuro, jurou um sem-mais-o-que-fazer na ante sala do salão de dança. Eu não digo nada porque não vi. Sério. Um grande abraço para todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 28/3/2010 11:21:10 |
BREJO DAS ALMAS ( Para Enoque Alves, da cidade de Francisco Sá, Minas Gerais) Suas lembranças do Brejo das Almas, singelas e bem escritas, me remetem - com prazer - a certas férias de julho ( duas , uma em 1956 e outra em 1957 ) e estou meio desconfiado que você era o arteiro e simpático menino que ficou nosso companheiro inseparável de mil e uma aventuras brejeiras. O outro mosqueteiro era Paulo Silveira ( dele você já era amigo desde criança ) , vulgo Paulo Batôco , querido amigo , colega de escola e ponta- esquerda dos bons do time de futebol do colégio. Eu era Center four.Dos mais ou menos.Meio barbantinho, senão todo. Rrs. Batôco era irmão dos saudosos Marquinhos e Roberto Silveira, que moraram numa feliz M.Claros de outras épocas e deixaram muitas amizades e saudades . Hospedei-me no Brejo naquela casa de esquina da rua Cônego Augusto, de “Seu” Luís Silveira e D.Menininha, pais deles. Mês de julho era lord, bárbaro, o máximo, era daqui ó, da ponta da orelha. Tem gente que nem sabe o que isto significa... Bom, nem tudo é perfeito! Meio diferente de hoje, que a garotada esnoba mar, praias ou cidade do interior e atravessa o Atlântico para ir ver aquelas caras e inócuas fantasias infantis de Walt Disney. A gente conhecia também a turma Disney toda , baratinho e semanalmente nas revistinhas em quadrinhos ou num filme maravilhoso chamado “Você já foi à Bahia”. Não sei se antigamente era ruim ou bom , ou se agora é melhor ou pior ( quem sou eu pra julgar ) , devo esclarecer aos mais críticos e contemporâneos , embora , devo confessar, do filme tenha gostado demais e dele nunca me esqueci. Carmem Miranda, Zé Carioca e Pato Donald com aquela voz de taquara rachada, bom demais. Enfim , tudo vale- como diz o outro - se existe emoção... E você, naquela época, aos onze anos como nós, sabia tudo de beira de rio, poços profundos dos piaus verdadeiros e curimatãs (as inconfundíveis zulêgas, como as chamávamos), que a gente matava de estilingue quando subiam à tona para pitar.Traduzindo: respirar, se é que peixe respira , não tenho a menor idéia. (Engraçado, a mesma coisa que os fumantes fazem hoje : têm que sair à rua para pitar um cigarrinho.Sorte que não tem gente com atiradeira esperando). Cinquenta e cinco anos . Pode-se dizer que tem um tempo bom aí , não é Enoque? Pra não ter de entregar o ouro e confessar um irreversível (porém bem vivido) meio-século na cacunda. Não me lembro de muitas outras coisas. Mas não esqueço do sítio de Seu França, onde, muito tempo depois, retirei personagens para um livro que adorei escrever e gostaria que você lesse .E, neste sítio de todas as frutas que existiam, junto com vocês, roubei e comi muitas e deliciosas mangas, goiabas , araçá, jambos e bacos-pari. (Será que está certo este plural , P.Narciso? Porque aí então seria Baco-Paris, que poderia sugerir até outras coisas. E boas! E do velho cinema de bancos de madeira, onde vi “Guerra dos Mundos” pela primeira e única vez; da pracinha da igreja onde as moças apareciam de noite e a gente ainda não sabia o que fazer com elas ; dos banhos de rio no poço da Provisória e incrivelmente , para registro dos historiadores de plantão, da loja de secos e molhados de Seu Olinto Silveira, na Praça do Mercado, que vendia de tudo e mais um pouco.Seu Olinto, com o maior carinho, sempre nos atendia com um sorriso ensinando-nos qual o melhor dos anzóis e pra qual peixe servia. Anos mais tarde, quando eu iniciava nessa sofrida e difícil arte, deu-me seu belo livro de poesias (Cantos e Desencantos), que guardo ( e leio sempre!) até hoje. Logo depois, ele e D.Ivone mudaram-se pra Montes Claros onde nos agraciaram , ambos num mesmo alto nível, anos a fio , com muita cultura e sabedoria. Enfim, Enoque, gostaria de dizer que v. possui a mesma esperteza ( no bom sentido), para escrever. É o que acho ( ...posso não ser tudo, mas também não sou nada, já dizia um filho de um amigo meu) e é de coração. V. tem a manha! Continue. Um abraço. Flavio Pinto |
Por Flávio Pinto - 20/11/2009 16:25:23 |
Olha o que achei : Lazinho, eu e duas beldades , montesclarenses-cariocas como ele dizia em suas crônicas, em plena praça da Matriz, no Centenário. Nada menos do que Angela Zimbardi, que posteriormente foi Miss Guanabara (acho que em 1959) e sua prima Sandra, de igual beleza e ainda garota. As duas são sobrinhas de Pedrinho Viriato, lendário e exímio dançador de "Lundu" e Beto (Trator) Oliveira, afinado cantor e solista do Grupo de Serestas João Chaves - ambos de saudosa memória - portanto pertencentes ao clã da Fazenda Ribeirão dos Ferros, endereço oficial do alambique onde sempre se fabricou a famosa cachaça "Viriatinha" , durante várias gerações. Nas férias elas sempre vinham para Montes Claros e a moçada ficava indócil. Tempos felizes de uma cidade alegre. Repare na bicicleta : Monark sueca,importada,aro 26, não saía de cima dela.Era de minha irmã, Cristina.Herdei. FP |
Por Flavio Pinto - 14/11/2009 09:22:41 |
CHUVA A chuva foi, é – e continua sendo – a grande bênção Não importa se venha forte e extrapole além das fronteiras do esperado ou se venha fraca e fique a dever às plantas, aos lagos, rios e plantações. A gente vê Deus na pouca ou tanta água e agradece. Mesmo fraca nos anos ruins e farta nos bons que sempre demoram a voltar, a gente deste norte querido sempre teve um carinho especial por estes doces e límpidos pingos que vêm lá das nuvens e nos traz tanta alegria aqui embaixo, fazendo o verde mais verde e lavando-nos literalmente o corpo e a alma das aleivosias e malquerenças adquiridas . Com a chuva – aleluia - vem doces lembranças de infância. O Rio Vieira (coitado, agora rebaixado para riacho por quem devia pensar mais, agir mais e falar menos) se transformava. De um manso caminhar de verde espumante (coitado , pelas descargas das primeiras fábricas do progresso) para um desvairado galope de cor de chocolate , onde sucessivas ondas e perigosos redemoinhos destruíam e levavam rio abaixo , sistematicamente, mal enjambradas pontes de madeira de caixotes e pregos mal batidos. Revigorada gambiarra artesanal de todos os anos pelos antigos artífices legais , que sabiam da fúria anual do velho Vieira e faziam o serviço sem capricho , talvez pela desesperança em querer desafiá-lo, ou, quem sabe, pela simples certeza da renovação anual de um fácil trabalho e mais um vintém para o bolso. Infelizmente, a história se repete. Asfalto vira poeira no primeiro uso e lama ao segundo pingo . Que entope tudo, trazendo infelicidade para muitos e fazendo a fortuna de poucos.. Antes, o Rio Vieira enchia e toda a cidade – meninos, velhos, senhoras e raparigas, todos juntos, democraticamente - ia ver aquela maravilha da natureza, com satisfação e um sorriso na face. Como o Rio Nilo , desde os Faraós, que saltava das margens e molhava a terra para o que mais se plantasse e tudo desse. Abraço a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 28/10/2009 08:29:12 |
CASAMENTO & LUA DE MEL Zequinha Rocha estava feliz. Trabalhou demais a vida inteira. Vida árdua na roça, sol forte e gado Nelore, difícil de mexer. Num teve nem tempo pra mulher, casamento, essas coisas... Solteirão não convicto a vida toda, mas agora, Deus seja louvado, estava do jeito que queria : noivo, prestes a se casar com Lourdinha, uma moreninha de 22 anos, cheirosinha e bonita de doer. No casamento, um festão, os amigos davam-lhe conselhos sinceros : ele, passando dos quarenta, ela novinha... olha lá! E lá se foram pra lua de mel. Lugar melhor num podia ter: Hotel Miramar, praia de Copacabana. Ficaram duas semanas. Na volta, os amigos - curiosos - vendo a brancura dele, mais pálido do que quando viajou: - Que é isso Zequinha , parece que v. não saiu do quarto nenhum dia?. - Moço, o trem é bom demais, num saí mess não. - Cê tá doido? - E Lurdinha? Moça nova, nunca viu mar, coitada ... Aí Zequinha acalmou todo mundo: - Pois viu...e foi todo dia. Eu só falava com ela : - Vai lá Lurdinha, sarga e vorta .. Ps : Em homenagem a meu amigo Reynaldo Souto, que sempre me contou este “causo” e outros mais, com muita graça e alegria. E quanto mais ele contava , mais eu ria e pedia pra repetir. E ele ria ainda mais que a gente. Grande Rey. Abraços para todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 10/10/2009 11:31:36 |
MINHA CIDADE O muito que se preza e diz de um passado feliz são históricos de felicidade – ou será que deveríamos dizer feliz cidade ? – vencendo a corrida e sobrepujando a triste atualidade que sufoca. Será preciso, então, uma férrea vontade para tentar manter bem próxima, que seja até nas vizinhanças do infinito, a verdadeira face do real e as fases dos bons momentos vividos, o mais perto que a vista pode alcançar e a mente absorver. O coração manda dizer. Não se preocupe com lineares caminhos porque nas questões subjetivas do coração, um perto pode estar daqui a milhões de anos-luz e ao mesmo tempo, nunca ter saído do seu lado. Dependem do poder de uma imaginação além fronteiras, sempre positiva. O que se vê aqui está na outra margem do rio. Quando os ventos sopram contra, a gente tem de rapidamente visualizar nossos grandes momentos e, ao simples olhar na sua antiga textura de paz infinita, ter forças pra agüentar o inconseqüente repuxo dos mal intencionados. Uma vez , mais uma e outras mais, se precisar . Com fé ( Deus seja louvado) , um pouco ou tudo de ruim desta má hora haverá de ficar para trás. Porque depois da tempestade, sempre vem a bonança , dizem os sábios e os navegantes. No prenúncio - onde sinos já tocam avisando - de brisas favoráveis e permanentes que certamente haverão de nos dar o grande poder , tanto mágico como natural, de enfrentar (e vencer) os desafios incertos do futuro. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 8/10/2009 10:00:49 |
DE MÃE E COQUETÉIS Numa velha infância de menino do interior, o que menos preocupava era a modernidade. O fogão - ainda e sempre - de lenha. Logo chegou o a gás, seus botijões e as lendárias perdas de lugar e conforto de todos os gatos domésticos. Sarava Seu Pedro Montes Claros, pai de Sinval, Tuca, Bem, Zé, Santinho, Taene e Dô Meu Fã. De lendárias e sempre lembradas histórias. Tinha que se manter o fogão sempre aceso, para a serpentina esquentar, proporcionando inesquecíveis banhos e a fumaça - eterna e continuamente - sair das chaminés, por onde, no fim de ano, Papai Noel desceria com mágica agilidade e , com certeza, ao ler nossas cartas , encheria de presentes nossas meias dependuradas e de alegria nossas quase inocentes almas. No rádio - sempre ligado na sala – os adultos ouviam à noite lacrimosas novelas (sempre repetidas à tarde) e a hora e vez dos meninos (e grandes,também) era na hora da janta, com as incríveis aventuras de Jerônimo, o herói do sertão e seu fiel companheiro, Moleque Saci. Sempre achamos que a mãe de Jerônimo ( Filho de Maria, homem nasceu... como na letra da música-trilha original) chamava-se Maria Homem. A vírgula sempre fez a diferença - desde aquele tempo - mas só descobrimos anos mais tarde. A primeira geladeira lá de casa foi uma Kelvinator, americana, acho. Funciona até hoje , embora reduzida a quase uma só função : manter cervejas geladas .No grau certo, ainda, diga-se. Ríamos escondidos da palavra “foods” escrita nas gavetas de verduras. Parecia um palavrão e éramos proibidos de repetir. Fabricamos – meus irmãos estavam também nessa empreitada – picolés de leite (o mais fácil de fazer, só leite e açúcar) e vendíamos para a meninada, por um terço do preço cobrado nas sorveterias. Foi um tempo bom, com lucros certos e divididos. Até o dia em que resolvemos inovar demais e fizemos várias forminhas de picolé de limão. Esquecemos do açúcar e acredito que tenha sido este detalhe o início do declínio e posterior fechamento da fábrica de picolés mais famosa da rua Lafetá 11. Aí outro aparelho moderno apareceu. O liquidificador. Walita, a única marca. O primo longe quase em extinção desta porcaria que vendem hoje aos incautos (sou um deles, infelizmente): a tal de centrífuga. Deve ter alguma coisa errada com este produto. Já repararam? Pelos shoppings e internet da vida- atualmente - está anunciado por um terço do preço original, com a indefectível presença de um velho atleta americano de oitenta e tantos anos ( que ninguém ouviu falar) arrotando saúde e - bem despretensiosamente - ajudando a vender . Besta do jeito que sou, comprei esta fúria antieconômica, devastadora e gastadora de alimentos. As massas, as polpas vão tudo para a lixeira e só sobra um dedinho de suco pra você tomar. Sem falar da sujeira que fica e entope as pias, a paciência nostra e das empregadas. Pra finalizar, já está no box da garagem, enfeitando retalhos de azulejos e latas velhas de tintas usadas. Mas, como eu ia dizendo... chegou o liquidificador em Montes Claros. E as mães enchiam a garotada de um novíssimo suco liquefeito que , nos primórdios entusiásticos da grande novidade, chamou-se coquetel. Sabiamente, mais tarde, em Montes Claros, tornando-se chique, “cocktail” assumiu sua verdadeira identidade, estrangeirada mistura de bebidas finas e título da famosa coluna social do grande e saudoso Laércio Vitaliano Pimenta, mais conhecido como Lazinho Pimenta, meu eterno colega de JMC. Passada a moda, denominou-se vulgarmente vitamina ( e é assim que o chamam até hoje, no interior e também nas capitais, se querem saber de cultura inútil). Todo dia, toda hora, lá vinha a vitamina. Uma festa em todos os lares montesclarenses. De tudo o quanto havia na dispensa. Beterraba com cenoura ( argh, ficava vermelha) , tomate,banana, umbu ( sete por um mil réis) tudo era misturado e empurrado goela abaixo na gente. Mas - com muito amor e carinho de mãe - era até gostoso. Lá em casa, só foi usado o copo de alumínio, dos dois que acompanhava o kit original.. O outro – o de vidro - para não quebrar, mamãe guardou, bem guardado, em lugar inalcançável e não sabido, que até nos fez esquecer que existia outro. E , nesse tempo todo, sempre usou-se o de alumínio , que resistiu anos, amassado, batido, mordido de cachorro, perdido e achado uma dezena de vezes. Quando mamãe partiu no início deste século ( que Deus a tenha), uma tia remexeu nas coisas dela num guarda-roupas antigo e achou o copo de vidro.. Ainda enrolado naquele papel branco e felpudo de fábrica e sem nenhum arranhão. Um choro só, lá em casa. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 6/10/2009 09:15:54 |
PRAÇA IMORTAL Bom começo de década, aquele super quente ano de 1951. Muita paz. A guerra tinha acabado há seis anos e só os americanos ainda gastavam a munição que sobrou. Na Coréia, longe demais. Entrávamos no mundo das letras e do conhecimento pela porta da frente: pré-primário no Colégio Imaculada, com a mais gentil e sorridente professorinha do mundo : Irmã Salete, que contava histórias de Aladim e Ali Babá e todos os ladrões das mil e uma noites, debaixo da sombra dos pés de manga da chacrinha . Ouvíamos extasiados e conferíamos em technicolor ( mais preto e branco, confesso) todas as inesquecíveis aventuras aos domingos , no Cine São Luiz, com acrobáticas peripécias de Douglas Fairbanks Jr. como Simbad, o Marujo e o rei das Caraíbas Errol Flynn , para nós e para sempre o Capitão Blood( no nome e no sangue quente) . E ainda tínhamos direito a dois capítulos inéditos dos Perigos de Nyoka, a frágil e bonita heroína das Selvas. Mas nada se comparava à primeira lição de natação dada pelo kiplingliano Sabu para uma dezena de saudáveis e irrequietos garotos , que mais tarde poderiam até se tornar verdadeiros campeões, como Johnny Weissmuller, o Tarzan maior de todos, campeão olímpico dos 100 metros de crawl, ou Buster Crabbe , medalha de ouro nas Olímpiadas de Los Angeles e nas horas vagas o intergaláctico Flash Gordon, paixão da louríssima Dale e inimigo número um do Imperador Ming. A aprendizagem ficou para trás e logo éramos nadadores Pois os regionais, estaduais e brasileiros, todos os campeonatos possíveis e impossíveis estavam lá , nos esperando. Seríamos dedicados, decididos e ganhadores , como nossos ídolos da imortal Praça de Esportes. (Ousaram falar em derrubá-la para ser ponto de ônibus? Onde já se viu uma coisa dessas!) Salve salve Luis Ortiga ( campeão daquela época e mais campeão agora na defesa do respeito à nossa querida cidade), os dos Anjos, Marco Antonio, Pedrinho e José Augusto, Joválcio Maurício, Gilberto e Leônidas Lafetá ,Zé César e Diógenes Vasconcellos, Haroldo Filpi, João Abreu ( que de Jabuti passou a Galo com merecimento) e muitos outros que nos davam o melhor exemplo e força para suportar os tantos mil e uns metros diários de treinamento , com tábuas ou sem elas. Só não valia subir nas raias .O gritos de Sabu e “Seu” Pimenta ecoavam nos ouvidos. Com direito a suspensão. Logo abrandada por dois grandes corações . No ano seguinte, em setembro, construíram um piso de madeira na piscina. Como se diz afetadamente, hoje em dia: um grande “ deck”. Por cima de toda a água, para um mega baile. A meninada aquática se esbaldou de brincar, mergulhando por dentre os novos e misteriosos caminhos dos caibros e pranchas abaixo da linha dágua e do Equador. Talvez à procura de mil tesouros perdidos numa perdida Atlântida renascida em pleno Prado Oswaldo Cruz. A festa era do algodão, que era a mais chique riqueza do norte e se comemorava com grande festa e eleição de uma rainha. Meninos não foram. Mas meu pai me contou que naquela madrugada Chico Alves morreu tragicamente e todos os presentes foram avisados na hora . E foi um baixo-astral geral. Abraço a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 16/9/2009 16:48:09 |
Olha só a boniteza (pura poesia de raiz)desta montagem, com fotografias antigas do acervo do Montes Claros.com. (e outra inéditas) na bonita voz de Elcio Lucas, grande cantor e compositor deste norte querido, nosso amigo de sempre da música e bons papos literários. Ele e o Grupo Raízes arrasam, dando muita saudade.. En passant, Elcinho canta também numa crônica minha antiga ( com o mesmo nome. Está por aí, arquivada) que tem a letra completa desta maravilhosa “De trem pra Montes Claros” , que faz a gente até voltar no tempo que já não volta mais. Como diz Ucho , você e os catopês: “Aúi” meus companheiros !! DE TREM PARA MONTES CLAROS Flavio Pinto Ontem à noite, na Praça da Estação, foi dia de grande festa na cidade: comemoração da volta do Trem de Ferro para Montes Claros. Como antes, de e para Belo Horizonte com direito à baldeação em Corinto, caso o cidadão queira ir para Pirapora ou Diamantina, onde também fizeram muita festa. A velha estação de embarque foi reconstruída igualzinha à original do século passado, apenas acrescentada, em seu interior, de alguma modernidade, necessária à navegação férrea atual, disseram-me. Infelizmente, lamento dizer, aposentaram a Maria Fumaça (foi a nota triste da noite). No prédio reconstruído: um moderno teatro para cem pessoas, um restaurante de comida mineira e um boteco com um balcão de aroeira de cinco metros de comprimento (cheio de rolos de fumo em cima), que vende de tudo, desde farinha de Morro Alto, passando por feijão andu e carne de sol, até pequi congelado (de quando é fora de época) para turistas e locais. E pinga, nem precisa falar. Tem de todas. Desde a curraleira especial de 2 pratas o litro a aquelas de mais de cinqüenta contos a garrafa. Para todos os gostos e bolso. Com um pequeno tablado no fundo para futuras cantorias. Não houve discurso de políticos, apesar de alguma pressão para tal (habilmente alguém lhes sugeriu que fizessem apenas parte do vocal). Aceitaram, mesmo meio desafinados. Houve sim, um grande show, comandado por Eduardo Lima (Goiabão), que veio especialmente de BH, com transmissão direta da nossa 98 FM (Montesclaros.com), onde se apresentaram quase todos os cantadores da cidade, famosos ou não, cada um cantando uma música sua ou do cancioneiro norte-mineiro. Apresentaram-se lá: Nivaldo Maciel, Clarice e os filhos de Benedito Maciel com o Grupo de Serestas João Chaves, mais Tino Gomes, Cori Gonzaga, Elcio Lucas, Beto, Patão, Gabriel e Ian Guedes, Aramis, Boteco e Tilpas, Ewanyzinho Borges, Zé Arlen, Marcelo Godoy, Bala Doce, Tico Lopes, e outros, cujos nomes não foram fornecidos à reportagem, mas que também cantaram bem demais. Foi um show maravilhoso de muita emoção, principalmente no final, quando Eduardo Lima puxou a linda música “De Trem Pra Montes Claros”, sendo acompanhado pelos artistas e todo o povo presente. E foi só bis até o sol raiar: “Essa estrada, leva e traz dor e alegria, a primeira caminhada, a primeira companhia. Vim do sertão, lá do meio da chapada. Quanto tempo, quanta estrada, tanta curva perigosa. É muito fácil, todo passarinho voa, toda mata sei que é boa, quando não tem alçapão. Tem nada não, caminhar por onde se passa, e mês que vem, eu vou de trem pra Montes Claros... Tem nada não, caminhar por onde se passa, e mês que vem eu vou de trem pra Montes Claros... E mês que vem eu vou de trem pra Montes Claros...” PS: Esta é a notícia que eu gostaria de escrever um dia... Quem sabe? |
Por Flavio Pinto - 4/7/2008 09:22:01 |
SONHO John Winston Lennon Faz tanto tempo Será que foi num sonho? Apenas um sonho? Eu sei, sim eu sei Parecia tão real, parecia tão real para mim Dei uma volta pela rua Entre as árvores quentes e sussurrantes Pensei poder ouvir Alguém dizer o meu nome quando começou a chover Dois espíritos dançando tão estranho Sonhe, sonhe solto Magia no ar, havia magia no ar? Eu acredito, acredito sim Mais não posso dizer Que mais posso dizer ? Em um rio de sons Através do espelho girando, girando Pensei poder sentir A música tocando minha alma,uma coisa quente, fria de repente A dança do espírito se soltando A música do espírito estava acontecendo. (Para o grande Pato, que sempre acreditou na grandeza deste sonho) Abraço a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 5/3/2008 14:40:05 |
PARA UM AMIGO Com o maior prazer, hoje, cedo este meu canto esquerdo de página, neste fenômeno universal que é o Mural deste querido Moc.com. Com tudo. Quer queiram quer não, com rima ou sem rima, este grande Mural transportou-nos à intimidade e conhecimento dos leitores de todo o globo terrestre ( montes-clarenses, claro.Os de outras cidades que ainda não o descobriram, infelizmente, não sabem o que estão perdendo), levando nossa palavra de sertanejo simples, de coração aberto, para onde até não se sabe onde. Aqui se fala certo do que está certo ou errado e, também, se escreve errado, quando necessário, para dizer o certo, pois Deus mesmo já nos deu o exemplo falando certo por linhas tortas, desde que o mundo é mundo. Isso, todo mundo sabe e ninguém contesta. (Então, larga de nóis, gente!). Por tudo isso e muito mais, eis aí o belíssimo texto de Murilo Maciel, honrando a família e as nossas raízes. Se o leitor quiser, para ficar ainda mais gostoso de ler, ouvir junto (no “link” das músicas de M. Claros tem) o aboio de Nivaldo Maciel (pai de Murilo) com Beto de Oliveira. Se estiver chovendo, então... Abraços e uma boa leitura para todos. Flavio Pinto _______________________________________________ SAUDADES DE TROPEIROS (autoria) Murilo Maciel – Março-2008 Permitam-me. Hoje, amanheci com saudade das pessoas, da família, dos amigos, daqueles de quem gostamos. Senti falta das cavalgadas, das risadas, das confidências, do cheiro do suor dos cavalos, do corpo cansado. Pela manhã o tempo esta mais para carrancudo, fechado, com prenúncio de chuva, ainda bem. Ontem no Buriti, na porta de casa, passou uma boiada tangida, fazia 6 pousos e ainda faltavam mais 2 para chegar a Canto do Engenho, seu destino final. O José Pereira, parecendo o dono da boiada, montado num cavalo castanho, do meio, perguntou pelo Nivaldo Maciel e falou da falta de seu aboio naquele momento. Ligeiro seguiu viagem, que não podia atrasar. Me deu inveja e uma vontade danada de acompanhá-los, no coice ou na guia, tomando poeira, sentindo o cheiro do estrume do gado e ouvindo o mugido das vacas cheirando os bezerros, misturado com o rouco gritar dos vaqueiros e o galope dos cavalos ataiando e tocando a boiada. Dormir ao relento, contando estrelas, ouvindo causos, café no bule, na beira da fogueira, aquecendo corpo e alma. Arroz tropeiro com carne seca, pimenta verde e uma boa pinguinha. Mais tarde a chuva chegou fazendo barulho no serrado, molhando os pequizeiros, cagaiteras e pananzeiros. Deve ter sido bem recebida pelos vaqueiros, com a graça de Deus, que já estavam adiantados na viagem, molhando a roupa surrada e aguando a esperança. Fiquei pensando naquele quadro, antigo para os dias de hoje mas verdadeiro de uma época passada. Quantos dos nossos já foram tropeiros. Levaram e trouxeram mercadorias no lombo do burro, nas bruacas e cangalhas, superando as dificuldades que se impunham, pelas longas distancias e falta de recursos. Criaram riquezas e construíram uma cultura, alicerce de nosso edifício social . Foram bandeirantes, aventureiros, desbravadores, comerciantes. Viveram a natureza rude, curtiram o sol do sertão, passaram por temporais, adormeceram ao relento e criaram trilhas para muitos passarem. Foram personagens atuantes e importantes da história e com mãos calosas a moldaram. Os nossos tropeiros guardam a memória de uma época e muitos ainda estão por aqui. São heróis, pouco reconhecidos, de um tempo não muito distante, com muitas histórias vividas para contar. Basta escutar. |
Por Flavio Pinto - 27/2/2008 09:48:59 |
UMA CERTA SANDÁLIA Mais uma vez ,Virgínia, parabéns. Pela precisão e objetividade. Depois da mensagem do Júnior ( que deveria ter colocado na mensagem seu nome todo– e ainda há tempo- já que fica difícil saber quem ele seja por esta denominação genérica que usou. Para agradecimentos , se for esta a verdade), realmente, causa estranheza ter havido tanto não-me-toques e pesar pela possível destruição da obra de Konstantin, quando seriam até chamados os filhos do escultor para acompanhamento, para seguirem passo a passo a planta original feita pelo autor. E ainda que ( e também ), tudo isso seria por uma causa maior, o bem público, etc, etc. e estas coisas filosófico-altaneiras que são sempre lembradas nestas horas de aperto. Para quê estas aveludadas declarações à imprensa, se já se sabia que a obra não era a original? Porque esconder um fato que não era culpa era desta administração e não iria atrapalhar em nada de nada? Se era réplica, picareta nela. Eu mesmo não teria escrito nada, perdido meu tempo, porque de picaretas nesta vida, nós, brasileiros, já andamos cheios. E há muito mais que trezentos por aí, a cada dia vai se vendo. Tem alguém lá no Céu dizendo: Viva nós... Abraços a todos. Flavio Pinto Ps: Estão faltando duas declarações. A bem da verdade. Oficiais. Do tal departamento Randall e do ex-prefeito, Deputado Tadeu Leite. |
Por Flavio Pinto - 13/2/2008 13:41:47 |
VAMOS COM CALMA, MOÇADA A gente vai vivendo, passa algum tempo nos bancos escolares e recebe dois tipos de informações. Algumas , vindas de grandes mestres e mestras, que duram para sempre. E outras - aceitas quase sempre pelo corre-corre do dia a dia na labuta pela árdua batalha da sobrevivência - que se misturam a mais um tanto de inutilidades passageiras aparecidas montadas nas modernidades galopantes que, via de regra, têm que se logo digerir para não se parar no tempo. Umas trouxeram o bem, e outras, infelizmente carregam nas entranhas o vírus do mal, que é o parente mais próximo do vírus do caos. Nenhum vindo da cibernética ou eletrônica, porque dessas máquinas a gente sabe o que se espera, desde que se saiba apertar o botão certo. (Nem tanto, de vez em quando) Saber isto, para quem quer saber alguma coisa a mais e não rejeita o progresso (do bem, diga-se), a tarefa não é tão difícil. Se der errado há sempre a chance de puxar a tomada. E não há nada contra uma tomada desligada – inclusive a da pilha - que possa fazer um computador. Mas, os homens com o vírus do caos não se pode desligar. Ou será que pode? Pelo amor de Deus, gente, é vero ? Desmanchar a obra de Konstantin ? Mandar outra pessoas recriá-la em outro lugar, com base em croqui ? E a assinatura dele na obra? Vão colá-la com argamassa na obra nova ? Vão chamá-lo para assinar de novo, numa réplica que ele nem botou as mãos ? Gente, o nome dele é Konstantin Kristoff. Merece muito mais que o nosso respeito. Estou custando a acreditar. Abraços a todos Flavio Pinto Ps: Jota, tenho certeza que seu coração não está nessa. |
Por Flavio Pinto - 26/1/2008 13:12:05 |
ÁGUA Hoje, acima da minha habitual ocupação de espaço neste Mural, onde me orgulho de ser um permanente convidado a emitir opiniões, sugestões, ou desvendar sonhos do absoluto infinito e trazê-los à realidade, ou vice versa, por que o real talvez seja mais irreal que a própria realidade , eu venho tão somente pedir, implorar até , se for preciso , por uma ação conjunta, de coração, do povo montes-clarense : Vamos ajudar, gente, agora mesmo, o povo de Mato Verde, o seu nobre cidadão Marcelo e o coronel do exército que está ajudando a cidade.(Leiam as mensagens no Mural, por favor) Gente boa igual a estes dois e a gente desta cidade não podem ficar numa situação igual a esta, dependendo de um mês a mais ou menos para pagar um carro-pipa que vai matar a sede dos moradores. Jesus mesmo disse: daí água a quem tem sede. Tomo mundo sabe disso, tanto é que ninguém nega um copo d’água a quem pede na sua casa. E Montes Claros é a nossa casa. Talvez, também, Ele esteja de olho e seja a senha secreta pra mandar São Pedro abrir as torneiras neste norte seco, no ano de 2008.. Não só neste, mas em todo o ano daqui pra frente até o fim dos dias. Quem sabe uma conta num Banco? Pode ser no Banco do Brasil – eu trabalhei lá e sei da seriedade existente – mas em qualquer outro, acredito, será a mesma coisa. Dinheiro que seria repassado ao Coronel e ao povo de Mato Verde. Que agradeceria ao Marcelo, seu bom filho. Onde estão os ricos que gostam de doar? É só um pouquinho e não vai fazer falta. Sou pobre – graças a Deus, não de espírito - não posso falar pelos outros, mas meu nome estará entre os primeiros a enviar a doação. Prometo. Abraço para todos. Flavio Pinto Ps: Sei que muitos vão dizer que há outras prioridades, que outros precisam mais, que já pagam impostos demais, que a responsabilidade é do governo, etc.e e etc. Tudo bem, só sei que se abrir a conta eu mando a grana. Feliz. |
Por Flavio Pinto - 21/1/2008 17:35:26 |
FELIZES LEMBRANÇAS Eu não sei onde mora a felicidade. Se soubesse, eu estaria na frente da casa dela, agora, batendo freneticamente na porta e já teria – ah! Isso teria! - com o maior prazer, avisado pra muita gente ir se encontrar comigo lá. Confesso que, até para uma meia dúzia de alguns poucos, quase um “tantin assim destamanin”- por alguma lágrima que saiu e já se perdeu na poeira graças a Deus – eu daria errado o número da casa. Mas, enquanto isso, vou fazendo o que posso e, pelo menos, posso compartilhar alegria, orgulho e emoção com meus concidadãos, aqui e agora. Causas e efeitos de um velho e maravilhoso livro, que reli há pouco. Para dizer como Montes Claros era, e como os políticos faziam política para melhorar a vida do povo. Com muita classe. E o povo reconhecia isso. Quem sabe você, político da atualidade, seja o novo, o mais ou menos ou o velho, há de se mirar neste exemplo? Ainda há tempo. ______________________________ Nas palavras do grande Nelson Vianna, um fato acontecido há oitenta e um anos passados: “Veio afinal o dia máximo de Montes Claros: o primeiro de setembro de 1926. Na chegada do comboio, a cidade conheceu os primeiros cordões de isolamento, para que pudessem desembarcar o ministro e sua comitiva. À noite, realiza-se o grande banquete no vasto armazém, então ainda inacabado. Ouve-se a esplêndida banda de música. É o ministro que chega com a sua comitiva. Acercam-se os convidados. Assentam-se. A mesa, magnificamente ornamentada, deslumbra. Quando Francisco Sá se levanta para falar, corre um frisson pela assistência em ansiosa expectativa. - “Existem prazeres na vida que, de tão intensos, costumam ser dolorosos...”. Em palavras transbordantes de carinho, faz a descrição da chegada a Montes Claros, do momento preciso em que, ainda de longe, se avista a pequenina igreja do alto dos Morrinhos – “... a capelinha branca, atalaia avançada dos povoados cristãos”, produzindo um verdadeiro êxtase para os ouvintes que parecem ter perdido de vez a respiração. Penetra em seguida no objetivo principal do discurso, estampando o promissor futuro que está reservado ao seu – ao nosso querido Norte de Minas. Percebemos então que aquele gigante da palavra é a fonte de misteriosa emotividade comunicativa que domina por completa a assistência. Estamos todos como que fascinados pela palavra fácil e arrebatadora do maior tribuno que até então havíamos ouvido e que arroja agora, sobre nós, um maravilhoso “fogo de barragem” em rajadas de eloqüência, tecido de imagens tão belas que nos deixam arrasados de emoção. Em meio aquele grande encantamento, porém, qualquer motivo estranho chama a nossa atenção. Voltamo-nos para o culto baiano Urbino Vianna, autor da bela Monografia de Montes Claros - e vemos, espantados, que as lágrimas lhe descem em torrentes pelas faces. E ele, embaraçado, a enxugá-las, procura desculpar-se: - Perdoem-me, meus amigos, mas vocês precisam compreender... Eu nunca ouvi nada mais lindo, em toda a minha vida... Eu não agüento, eu não suporto isso... E, com a sua conhecida “falta de costumes”, levantando o braço em plena mesa do banquete e apontando em direção ao ministro, tem uma única frase que só sós, os seus amigos, saberíamos interpretar: - Aquele homem é um monstro... Preso de violenta emoção, nada mais pôde dizer. E procurava enxugar as lágrimas que pareciam cair mais e mais... ” (texto extraído do livro “Foiceiros e Vaqueiros”) Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 9/1/2008 10:18:45 |
DOIS MIL E OITO NA MIRA Quando não se quer uma vez... Sequer uma vez mais será necessário, se não se quiser mais do que esta única vez... Só pra dizer aos queridos concidadãos eleitores. (A fórmula é antiga, a gente é que anda meio esquecida dela) Se quiserem expulsar de vez a violência, o crime, a insegurança, a falta de dinheiro e talvez até a maldade alheia - para não falarmos de mil e outras coisas ruins mais e gastarmos todo o nosso espaço - existe a possibilidade de um simples remédio para se aplicar - a curto ou médio prazo – e obtermos excelentes resultados. Que poderão ser até mesmo incríveis. Um curto e grosso “não” nas urnas a todos que simplesmente achamos e desconfiamos que: - já provaram não ser dos mais honestos. Nem dos menos. E ninguém é mais ou menos honesto; - eram pobres, ficaram ricos rápido demais, sem serem tão competentes assim; - eram ricos e ficaram mais ricos, idem; - não ficam com raiva e vermelhos quando lhe dizem que roubam, ibidem; Este “não” é para isso: não votar em quem se acha (ou se tem certeza) que não merece. Isso cada um sabe, mesmo quem não entendeu nada até agora e a vida vai passando. Se Deus quiser. E vai querer. Mesmo por que, Deus, sempre ocupado demais pelo conturbado universo total, não agüenta mais só pedido de mais chuva, menos sol e muito dinheiro no bolso, todo ano. Quem sabe Ele esteja até deixando pra nós, humildes mortais, acabar de vez com esta repetitiva tragédia geral. Ave Maria. Abraço a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 31/12/2007 11:54:07 |
ÚLTIMA NOITE Na última noite do ano, a mesma madrugada de sempre, na cidade. Num tempo que todos os gatos ainda eram pardos. De noite. A chuva era leve, mas já tinha sido pesada durante o dia. Sempre um barulho de misteriosas pisadas na calçada - bem atrás - a perseguir as viv’almas da rua, boêmios amadores e ocasionais, cansados de tanto gole e festa, querendo apenas chegar em casa, deitar, dormir e sonhar com todas as venturas passadas. Na rua, rangendo pneus, a bela caminhonete, verde musgo. Amigo, de longa data, dirigindo, alegro, ma non troppo. Carona para apenas mais um quarteirão que faltava. Melhor que não, falta pouco, diplomacia de velhos amigos que continuarão sempre assim. Uma acelerada a mais, em fingida chateação pela perda de uma possível saideira que, certamente, se transformaria em mais um desabafo daquele traiçoeiro amor que acabara de lhe machucar o coração, eis que a caminhonete sai do prumo e roça um poste de luz ( inadequadamente colocado no passeio, na visão dos presentes ) , tirando-lhe maiúsculas raspas de cimento que duraram até o passe e repasse das vassouras das varredeiras, ao nascer do sol. Estas tagarelavam sem parar, mergulhadas na sua própria vida, noutro distante lugar dali. Funcionárias públicas e indiferentes à passagem das senhoras de preto, descendo lentamente a rua em direção à igreja. Queridas beatas, oficiais e de direito, eternamente inconsoláveis, dedicadas agora somente à contrição, o amor à família, à religião, à amizade com os padres, comissários de Deus, á espera do último check-in para a derradeira viagem às maravilhas do grande paraíso prometido. Que assim seja. E orai por nós. No outro dia, o telefone, a mãe, o pai, um aviso te interrompe os sonhos. O Rio Vieira, ali mesmo à porta, cheio, a água cor de chocolate passando por cima da ponte de Simeão. A caminhonete do amigo, mergulhada, de frente. Mal dá pra ver a placa na carroceria. Na preocupação geral, ele, todo molhado, sentado no barranco, dá um lânguido olhar para a placa que já lá ia acabando de sumir na água, grita pros amigos: - Aprendi a nadar foi na Praça com Zé Sabu, gente! E dali, pura alegria, saímos pra rebater. Um abraço e feliz ano novo para todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 25/12/2007 22:25:52 |
CARAVELAS Á PARTE Depois de um de um quase perfeito relax interior , para considerações e reparos que só um descanso total – físico ou mental, tanto quanto possível - pode alcançar , estamos aí , de volta ao nosso lugar, neste Mural, finalmente. O meu obrigado aos poucos (e fiéis) leitores que tiveram o carinho de se preocupar e perguntaram pela ausência. Para eles é que volto. E para minha alegria, também. Com o maior prazer. Neste ínterim, fico sabendo que não conheci um especial leitor ( na palavra amiga de P.Narciso: “seu maior fã, Flavão. Se começava a demorar coisa sua no Mural, ele me parava na rua e sempre perguntava porquê”} . E a tristeza me pega mais ainda, ao saber que era filho de um grande amigo de toda uma vida, Rey Souto, mestre das letras e da alegria contagiante. Era o próprio rei, esculpido em Carrara, finalizou Paulinho. Mas, voltando ao recesso, talvez à procura de onde o complexo e enigmático se escondem - certamente bem além do que se pode enxergar - posto que o óbvio nem é mais ululante assim, ensaiou-se por este velho escrevinhador um pretenso retiro espiritual às forças ocultas das naturais agruras ( ou sobrenaturais, quem sabe?) da vida.. Talvez pelos caminhos entremeados de espinhos e pinguelas de aroeira redonda, cheia de lodo, sempre a sombrear essa mania ou arte primeira ( ainda não sei), que é plantar e colher as próprias idéias - das menos significativas às mais puras e belas, incultas, talvez, no jardim particular dos sentimentos - e tentar juntá-las às letras e palavras que voam e revoam, mágicas, ao nosso redor, como se fossem oferecidas e desajeitadas mariposas de pós chuva revoando até morrer nas brilhantes luzes amarelas dos postes de rua. Esta sim, caro amigo, a verdadeira a alegria do mais humilde poeta , apenas um artesão da sorte no corte e palavra da nossa linda língua pátria. (Desculpem-me, mas, de repente, no meio de tudo, sem quê nem porquê, as lembranças me levaram aos velhos postes de luz da Coronel Prates . Esqueci o nome da bonita e nova mercearia de secos e molhados ! Se alguém quiser me dizer...) Salve, salve, então, ó casa santa, porque esta é a volta deste ex-moço, revigorado e mais firme do que nunca - mais para quase, confesso - que nem prego no angu, como bem diria nas areias piraporenses o saudoso mestre de sete estrelas, Gilberto Sóter, num quentinho canto qualquer de areia na beirada do velho Chico. E que, antes qu’eu me esqueça, senhores e senhoras do bem acima do mal: até nosso glorioso e altaneiro rio , os homens do mal , abaixo do bem - sem fé e sem raízes - estão resolvendo avacalhar. E, é claro , nunca conseguirão, se Deus quiser , pois o povo está de olho nestes jurões e seus juracis puxa-sacos. E tomem cuidado, juras, pois estamos na vigília, dia e noite, noite e dia.. Enfim, por andanças d’aquém e d’além mar, em prazerosos bordejos pelas vilas, cidades, negras florestas e medievais terras tedescas, altas e baixas, ouvindo no rádio, sempre ao lado ,Godoy , Yasmin e suas Tihaias, a deslumbrante gália, quiçá catalã, onde logo à primeira vista se gosta de tudo e de todos e se observa ( tirando-se o chapéu ) o respeito aos mais velhos, amigos e inimigos de guerras - que não foram poucas e deixaram marcas ainda a superar - amor à arte, à tradição do que se fez bem e o carinho no que hoje se faz, bem também, para durar e perdurar no sempre da história , porque só assim se consegue sobreviver aos piores males , bombas, canhões e epidemias sem cura deste mundão doido, sem fim. E mais do que tudo isso, conseguir dobrar os séculos eternizando a solidez e sustentação ao nosso mundo contemporâneo, para dias de luz e festa do sol que todos queremos viver em perene tempo de paz, apesar das ameaças, do desrespeito e violência à nossa fé e vontade de apenas querermos ser felizes. Com bossa. Chega de saudade. Abraço para todos. Flavio Pinto Nota - (para não montes-clarenses) jurões, juraci, jura : otário |
Por Flavio Pinto - 6/6/2007 14:45:33 |
FIRMANDO A GUICHA Muito mais que tudo, sinto - com o coração partido - ver nossa querida terra de muitas léguas e adjacências, distanciar-se da eterna e modesta sabedoria do bem viver, deixando viver. A velha máxima, natural - dádiva sagrada de magníficos ancestrais - de dar chances e nuances a quem não as possui, de berço, nascimento, fé e orgulho, fincada com simplicidade no decorrer de todos os 300 anos ou mais, das vilas e cidades passadas e contadas, esvai-se de repente, como uma luz de vela ao sopro de um vento devastador. Sopro traiçoeiro, da discórdia e ódios remoídos. Onde nos levará? Talvez seja a pergunta. Caboclos bons de tudo, de enxada, tiro e gole, sobreviveram muito bem por aqui, neste norte de sol - sempre muito sol a norte de um sul bem longe – suados, saudáveis e saídos do nada, e construíram a harmonia perfeita de uma perene paz, mesmo que se fosse, ou parecesse, um tempo de pólvora , chumbo e bala. Vamos nos lembrar deles com carinho, firmar a guicha e construir o futuro. Abraços a todos Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 21/4/2007 09:08:44 |
PIZZA NO CÉU Meus irmãos, o Limbo acabou em pizza, também. Graças a Deus.E aos teólogos do Vaticano, estes homens de tão boa-vontade da Comissão Teológica Internacional da Igreja. Esta prática comum, que a gente pensava só existir nos países mais tropicais além ou abaixo do Equador, acabou de alcançar alturas antes inimagináveis e chegou até aos aprazíveis balneários e verdes colinas do Éden. Onde fica o divino, maravilhoso, como se extasiou Caetano, um dia. Lá, aonde se acredita, somente os bons de coração chegarão se forem bons até o último segundo antes da última viagem. Precisamente, na hora de se fazer a derradeira confissão, que perdoará algum (ou todo) mal esquecido pelas pinguelas afora das espinhentas quebradas da vida. Desde os tempos de catecismo, sobrevivendo até uma passagem de século – como lá se vão, longe, as lembranças dos sacros ensinamentos diários - onde se aprendia quão árduos eram os caminhos que se nos levam ao Paraíso, bem além das fronteiras da mais longínqua serra antes do céu azul. Liberdade, ainda que tardia, como diria um bom conterrâneo inconfidente destas misteriosas minas gerais, àqueles inocentes que morreram antes do batismo, ou aqueles outros, pseudo-bárbaros dos tempos antigos que, barbaramente, não puderam conhecer quem lhes ministraria o “eu te batizo em nome do Pai”, e assim, por descuido, falta de tempo, desconhecimento ou por simplesmente estarem no lugar quase errado na hora incerta, não puderam fazer parte, injustamente, do seleto grupo de oficiais aspirantes ao reino da felicidade eterna. E , acaba daí, que ganhamos nós, aqui embaixo, humildes viventes , um tanto crentes, um tanto descrentes. Porque , agora, certamente, teremos mais e mais celestiais ajudantes cheios de vibração ( face à inércia de milhões de anos ao calmo e doce “dulce far niente” do ex-Limbo, lógico), vontade de trabalhar e olhar o próximo , ajudando a nos livrar desta violência e maldade do dia a dia - cada vez aumentando mais - onde somente um anjo da guarda, convenhamos, já não estava mais dando conta do recado. Principalmente aqui no Brasil, nunca se precisou tanto de um estepe de anjo da guarda. Amém. Benção para todos. Dom Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 21/3/2007 07:41:35 |
VI A OBRA E CHOREI , VIRGÍNIA Lágrimas de um ex-tocador de tarol de uma banda que acompanhou um desfile das alunas do Imaculada. Externas e internas abrindo a parada. No apito de D.Lígia Dias. Boinas e golas de marinheiro. Dia da Pátria. De paz. Bandeiras tremulando no Diocesano, no meio da Avenida. Ali mesmo. Coronel Prates. Os dois Padres, Agostinho e Gustavo, em pé, posição de sentido, pensando em Latim. Talvez em Deus, talvez nas segundas épocas. Da rapaziada do velho Colégio que não existe mais. Poucas alunas em uniforme de gala. Carminha, Layce e Rosemary. Em seguida, Escola Normal e Instituto. No final, o TG. Oitenta e Sete. Continências. O povo batia palmas e soltava foguetes. Como festa de São João. A Rua da Fábrica, que já tinha sido estrela e jatobá, agradecia, feliz. O tambor repicando , o pessoal marchando, marchando. Até parar. Hora do footing. Paquera. As boinas e os casquetes nas mãos, os cabelos arrumados. O sargento vigiando os atiradores. As freiras de olho nas moças. O tocador, no olhar de certa. Olhar que atravessou toda a avenida e se perdeu no tempo. Como os corações. E a cidade, cada dia mais na saudade. Apenas uma ponta de futuro, em estoque. Pra quem entrar na fila e pagar. Não sem pesar. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 8/3/2007 13:31:44 |
UM ESQUECIDO CENTÉNÁRIO (2) Virginia , primeiramente, como é bom tê-la de volta aqui no Mural. As palmeiras se foram, mas os sabiás ficaram. Graças a Deus. E aqui estamos nós, novamente, dizendo coisas que os novomontesclarenses (existe este termo ? Se não, passa a existir agora) teimam em querer fazer-nos esquecer. Velhos sobrados, arborizadas avenidas, rico folclore, lembrança de grandes nomes e fatos do passado, para quê? Qual o lucro disso? Sempre dizem, achando que bolso recheado compensa pobreza de espírito. Talvez para tentarem se incluir, miseravelmente, como pseudo-arautos de um mundo novo, tentando fazer uma nova história, à falta de conhecimento desta própria e maravilhosa existente, tão rica quanto o maior dos tesouros que se pode querer neste mundo. Mas... Deixa pra lá! Você citou o livro de seu pai “Montes Claros,Sua História, Sua Gente e Seus Costumes” para outros detalhes sobre o assunto, mas eu gostaria de ir mais além. Como talvez haja algumas pessoas que não têm a felicidade de possuir este tesouro que é o livro do Dr.Hermes, transcreveremos dois textos dele sobre os episódios de 1832 e 1857, bem registrados às páginas 18 e 21. E assim, outros conterrâneos poderão fazer, também, sua análise sobre os acontecimentos históricos e participarem aqui com a gente. Serão todos bem-vindos. 1) “UM DIA DE FESTAS PARA NOSSOS ANTEPASSADOS 16 de outubro de 1832.´ Às 4 horas da madrugada um salva de 21 tiros saudou a população. O sino dobrou em repiques. Mais cedo do que de costume o largo da igreja (hoje Praça Dr.Chaves) foi se povoando de fisionomias alegres, esperando o grande momento – a posse da primeira Câmara Municipal. É que pela lei de 13-10-1831 o arraial de Nossa Senhora da Conceição e São José fora elevado a vila – Vila de Montes Claros de Formigas. A eleição já se realizara, não havendo mortos nem feridos na apuração.E havia chegado o grande dia da posse, da emancipação política e administrativa. - “Agora sim, somos senhores de nossos narizes” – disse o Pe.Ambrósio Caldeira Brant, ao passar para celebrar a missa, em que seria assistida pela Câmara eleita, pelas autoridades e pelo povo em geral, em ação de graças. Após a missa, realizou-se a sessão solene. A casinha da Câmara não cabia um terço dos que desejavam entrar; o aperto era medonho; ninguém passava, mas... repentinamente surgiu entre o povo a figura venerável do Cel.José Pinheiro Neves. Todos os olhares acompanham-no com admiração, respeito e...(por que não dizer?) uma pontinha de inveja – era ele o grande chefe, o presidente eleito, o primeiro presidente da vila... Vinha à frente de outros cidadãos também sisudos. Os Vereadores. Entraram na sala principal – o Paço Municipal – e se dispuseram em torno de uma grande mesa. O silêncio se fez profundo. Pe. Ambrósio entregou ao Cel.Pinheiro os Santos Evangelhos ; êste com a dextra espalmada sobre o livro sagrado, falou de cor, compassadamente o juramento de cumprir o seu dever, colocando o bem coletivo acima do particular... Sendo acompanhado em voz alta por todos os vereadores. Em seguida fez Pinheiro Neves um pequeno discurso, expondo seu plano de governo. O vereador Mourão, vice-presidente e adversário político do presidente, falou também em nome da minoria. Seguiram-se vários assuntos. Foi escrita e assinada a ata. Terminada a parte cerimoniosa, serviram-se aos presentes bebidas em profusão. À noite, todas as casas da vila se iluminaram, terminando o dia com um animadíssimo baile na residência do Cel. Pinheiro Neves, situada onde está hoje o Palácio Episcopal. 2) CIDADE A 3 de julho de 1857 pela lei nº 802 a vila de Formigas foi elevada à categoria de cidade – cidade de Montes Claros. Não encontramos registrado, em nossas buscas, nada que demonstrasse o regozijo da população pelo acontecimento. Nada de oficial, a não ser o texto da lei ; mesmo a tradição oral pouco transmitiu até nossos dias. Sabe-se apenas que a Banda Euterpe Montesclarense, fundada no ano anterior, saiu à rua pela primeira vez no dia em que se festejou o fato. Poucos benefícios a transição nos trouxe, pois a nossa vila já desfrutava práticamente de todas as regalias de cidade – era independente em política e administração ; era cabeça de Comarca, com Juiz de Direito e Municipal; possuía Cartórios, etc.,etc. Daí o fato ter se apagado tão ràpidamente da memória dos montesclarenses. A mudança do nome para Montes Claros veio ao encontro de uma velha aspiração dos formiguenses, conforme se lê no livro de atas das sessões da Câmara em 26-7-1844: “O Sr. Presidente propôs que existindo duas vilas do mesmo nome de Formigas nesta Província e resulta muitos ofícios e papéis se desviarem, por isto era conveniente que se dirigisse à Assembléia Provincial por intermédio do Governo para mudar-se o nome de Formigas para Vila de Montes Claros”. Não deixou, portanto, de trazer certa satisfação a transição de vila para cidade”. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 6/3/2007 12:02:07 |
UM ESQUECIDO CENTENÁRIO Sobre as comemorações do Centenário de Montes Claros , de 1932, lembrado - com muita propriedade e conhecimento da nossa história - pelo sr.Gildásio, na mensagem 21520 de 28/02/2007, eis aqui a minha modesta colaboração para um melhor entendimento desta verdade histórica , infelizmente, um tanto esquecida ( ou desconhecida, quem sabe ?) pelos nossos caros conterrâneos. Como bem diz o muralista, “a cidade o comemorou ruidosamente, com dias de festa. Basta consultar nossos jornais, muito citados e poucos conhecidos, ultimamente”. É que, por acaso, sendo sobrinho do Prefeito da época , Orlando Ferreira Pinto, tenho guardado ( como relíquia de família) estes jornais citados pelo Gildásio, dos quais gostaria de transcrever alguns fatos acontecidos e noticiados na época, na “Gazeta do Norte”, edição de 15 de outubro de 1932.. Como é muita coisa e neste espaço muito especial deve-se ser breve, começarei hoje apenas transcrevendo o programa dos festejos, após o anúncio na Gazeta de “feriado municipal o dia de amanhã, por decreto do sr.dr.prefeito do município, será considerado feriado municipal o dia em que será comemorado o Centenário da cidade”. “ O PROGRAMMA DAS FESTAS O programma das solennidades de amanhã, está organisado da seguinte fórma: 5 horas – Salva de 21 tiros. Alvorada pela banda de música “Euterpe Montesclarense”; 10 horas – missa campal na Cathedral em construcção, celebrada pelo snr.Vigário Geral da Diocese, com assistencia pontificial de S.Excia. Revma.D.João Antonio Pimenta; 11 horas – Inauguração do monumento ao sr.Francisco Sá discursando no acto S.Excia.Rvma.D.João Antonio Pimenta ; 1 hora da tarde – Inauguração do edifício da Prefeitura Municipal. Bençam do Prédio pelo Cônego Marcos Van In. – Sessão solemne do Conselho Consultivo em que falará, abrindo a sessão, o Sr.Prefeito Municipal . – Inauguração dos retratos do snr.presidente dr.Olegário Maciel e do snr.Prefeito dr.Orlando Ferreira Pinto. Offerecendo-os falarão os snrs : Conselheiro Cel.João Martins da Silva Maia e Dr. J.A. Pimenta de Carvalho; 3 horas da tarde – Inauguração do matadouro municipal.Bençam do mesmo pelo Cônego Lucas Van In. 4 horas da tarde – Auditorium na Escola Normal Official. 5 horas da tarde – Parada pelos alumnos de todos os estabelecimentos de ensino da cidade, na Praça Dr.Chaves; 7 horas da noite – Retreta pela “Euterpe Montesclarense”, na Praça Dr.Chaves; 8 horas da noite – Solenne “Te Deum” na Cathedral com assistência de S.Excia.Revma.Snr.Bispo Diocesano. Fará a oração congratulatória o Revmo.Snr.Conego Marcos Van In, Vigário Geral da Diocese; 10 horas da noite – Recepção pelo Governo Municipal, na Prefeitura, à sociedade de Montes Claros, a qual será offerecido elegante baile. Nota – Todos os actos serão abrilhantados pela Banda de Musica “Euterpe Montesclarense”. Caso o tempo não permitta a realisação da Missa Campal esta será celebrada na actual Cathedral.” Abraços a todos Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 8/2/2007 11:39:16 |
CARONAS DOS POETAS (Francesco, lá da Itália, começou ) Onde, meu Deus, a pureza de minha terra, que canta dentro de mim. "Tão longe, de mim distante, onde irá, onde irá teu pensamento. Quisera saber agora, se esqueceste, se esqueceste o juramento. Quem sabe se és constante, se ainda é meu, seu pensamento. Minh’alma toda devora, da saudade, agro tormento." Ainda por Deus, acrescentem: "Sei que Jesus não castiga Um poeta que erra Nós, os poetas, erramos Porque rimamos, também Os nossos olhos nos olhos De alguém que não vem" Por Ele, finalmente: "Amo-te muito como a onda a praia A praia a onda que a vem beijar Amo-te tanto como a branca pérola Ama as entranhas do infinito mar" (Depois dos lindos versos de “Quem Sabe?”,de Carlos Gomes e Bittencourt Sampaio e “Serra da Boa Esperança”, de Lamartine Babo, só me restou complementar com o melhor de um montes-clarense, que não preciso nem dizer o nome) . Em tempos revoltos, com turbulências no ar, na terra e no mar, o melhor é colocar a poesia no coração. Logo, logo, o errado some. Pela graça de Deus. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 26/1/2007 12:08:24 |
SONORAS QUEIXAS E pensar que - até pouco tempo atrás - havia quem reclamasse do som de um velho eixo encontrando-se com um voltear sem fim da roda do carro de boi, atiçado um pouco mais por uma solução de óleo de mamona pingando eficaz e homeopaticamente no mesmo lugar , aumentando o ranger que logo virava cantoria , subindo e descendo vagarosamente todas as ladeiras que encontrasse pela frente. Subidas , descidas e vencidas, nas voltas e de novo nas idas, ruim para alguns ( de pouca paciência), bons para outros, de boa vontade e de bem com a vida. A queixa do som alto sempre existiu. Dos passarinhos que trinavam bonito nas gaiolas dos vizinhos. Do canto dos galos mais machistas que acordavam cedo já pensando nelas. E elas (as galinhas) adoravam. Dos gatos de rua apaixonados e seus bacanais noturnos, de escandalosas mordidas, frenéticas unhadas e histéricos miados. Dos cachorros mal educados e seus latidos de todas as madrugadas, principalmente nas madrugadas de sextas e sábados, quando se, em sendo trabalhador, precisava-se dormir até mais tarde. Mas tudo era natural e acabava se acostumando. Hoje, em qualquer lugar que se vai este apocalipse sonoro nos acompanha. Até na praia, onde se pensa ir - após um ano de sacrifício – atrás de um pouco de paz e quietude que o mar – antigamente - nos oferecia, a invasão dos ritmos duvidosos - e sua licenciosa desarmonia - leva-nos a crer que somos meros estranhos nesta terra que já foi nossa. Na mesma moeda, em alto e bom som. Reclamem. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 11/1/2007 12:10:41 |
BÊ ERRE UM TRÊS CINCO Neste fim de ano de muita chuva que faz tudo ficar verde e bonito, rodeado da gente boa dessa terra boa que querem a todo custo transformar em ruim, eis me aqui de volta, meio feliz, meio encantado e energizado pela força de dezenas de carnudos pequis degustados com o verdadeiro prazer de quem gosta. De manhã, de tarde e de noite, entrando até na parte que cabe a quem não é muito chegado à saborosa frutinha amarela. Que tanto pode ser fruto e bendito seja entre nós. Graças a Deus, pois somos catrumanos mesmo, sem jeito de ser não mais do que isso, radicais e apaixonados. Desculpe-nos a repetição, mas o tanto quantificado é mais ou menos quando se diz a alguém sendo demais, passando das contas : “aí pode largar...” Mas e o meio qualquer coisa, dito acima, tanto da felicidade como da energia ? Aí, então, sou obrigado a dizer, embora relutantemente, caros conterrâneos e amigos: é por conta da velha estrada para a capital, a outrora famosa “ bê erre um três cinco” . (Nem merece mais a denominação oficial, para mim) Ou melhor, dos buracos dela, do dinheiro que gastaram para tapá-los, que mais uma vez, embora a gente acreditasse pela enésima vez que desta vez ia dar certo, acabaram fazendo um reles e pobre serviço. Porco, no mal sentido, pedindo desculpas ao animal pelo uso do nome. Nosso ex-orgulho, duramente conseguido, no sangue e na raça dos nossos grandes e antigos políticos, que antes deles próprios, pensavam mais na sua gente. Precisou até da ajuda das nossas mais lindas vozes e melodias, no pé da orelha de um próprio Presidente da República. Tristemente, o que se vê agora são pessoas inocentes pedindo moedas, por um serviço não contratado que se desmancha aos primeiros pingos de chuva, pobres coitados - vítimas da desgovernança geral prometedora de paraísos próximos - ousada e inadvertidamente, colocando em risco suas próprias vidas ,além das dos ocupantes dos veículos, que trafegam nas duas mãos, à sua conveniência, para não cair nas perigosas crateras sem fim. E o perigo de morte, a cada instante, que multiplica por mil, se estiver chovendo. É isso aí minha gente. Indignação para quem pegou o dinheiro e gastou fazendo castelos de areia para a gente admirar até a próxima eleição. Já anotei. E guardei. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 22/12/2006 13:02:45 |
O MURAL Desde que Kenneth H. Cooper , médico e coronel da força aérea americana, escreveu seu famoso livro sobre aeróbica, enfatizando um sistema de contagem de pontos para melhorar o sistema cardiovascular, em 1968, popularizado no Brasil pelo falecido Cláudio Coutinho,ex-técnico da seleção brasileira de futebol, no meu entender, acho que nunca houve uma mudança tão radical ( e benéfica à saúde , claro) na vida e costumes das pessoas. Tanto aqui como por este mundo afora. Há alguns anos, a atividade física em locais populares era proibida aos maiores de idade (leia-se final de segunda , adentrando a terceira idade), principalmente do sexo feminino, obrigados pelas leis não escritas dos execráveis capítulos do recato e pudor ,sempre presentes nos livros da falsa moralidade, a somente exporem pernas, braços, coxas e canelas nas próprias casas e seus quintais ( pra quem tinha a sorte de os possuir), clubes fechados ou sítios, se quisessem um conforto a mais na hora de fazer o sangue correr , livre e quente, nas temidas veias e artérias, canaletas do bem ou mal estar permanentes. Este quadro já não existe mais. Graças ao Mr.Kenneth. Então hoje só se vê, por onde se passa, senhoras de madura idade, velhinhos enxutos,firmes na guicha e no prumo, andando livremente por praças, ruas largas e avenidas, jovens na vida novamente, o papo em dia com os netos e a moçada, uns ligeiros, outros mais devagar, sem nenhum falso sentimento oculto de vergonha de mostrar pernas gordas ou secas de azuis varizes antes latejantes no silêncio do quarto de dormir, esperando a hora da viagem. Hoje, todos querem (os) e procuram a sobrevida. De Nike ou de Conga. Que a vida é bela e este é o caminho. E o Mural ? É o Cooper da atividade intelectual do montes-clarense. Quantos poetas, quantos escritores, quantas idéias estariam hoje dentro da gaveta, junto a mofo e seculares poeiras, se não fosse este Mural mágico para retirá-los do buraco negro onde estavam e trazê-los para cá, cada um de seu jeito, seja mais culto ou menos sabido, mas sempre dando seu recado e fazendo-nos ver que existe realmente vida e corações alegres que batem à nossa volta. Feliz Natal e abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 5/12/2006 11:47:45 |
A POESIA DE VIRGÍLIO A gente mantinha - desde algum tempo - correspondência pela internet. Não muito freqüente, porém de valiosa consistência, principalmente quando me mostrava alguns escritos de sua lavra, na maioria lindos poemas, sempre retratando com sentimento fatos e personagens da nossa história - brasileira ou universal – guiado pela alma sensível e apaixonada do verdadeiro poeta. Pelo seu próprio jeito de ser, calado e mais na dele, hesitava em publicá-los e vez por outra me perguntava o que achava. Quando eu lhe cobrava, brincando, que já estava passando da hora de “mostrar pro mundo”, ele só dizia: “Será?” Abraçando D.Fina, Virgínia, Valéria e Patrícia - nesta triste hora - peço permissão para publicar um, aqui no Mural, que bem expressa esta face poética do historiador, escritor e muralista Virgílio Abreu de Paula, pouco conhecida de muitos, mas não menos brilhante e imortal. Abraços a todos. Flavio Pinto IRACUNHÃ Virgílio de Paula (2005) Em festa a tribo E o velho cansado Sozinho consigo Relembra o passado, O tempo já ido De jovem ousado Audaz, destemido Feroz, arrojado. - De que serve a vida Doente e só? Que triste legado Do fado sem dó. Não importa morrer. Desvalido, magoado, Que serve viver? Mas vê, de repente Visagem encantada No meio da gente Que enche a taba Uma bela tupi. Seus lisos cabelos Sua pele bronzeada Seu rosto moreno... - Igual nunca vi. Da vida a chama Sente reluzir O fogo do amor Aquece-lhe a alma Por que não amar? Por que não sentir, Mesmo em segredo, O doce calor? Melhor que penar, Seu sol ressurgir. E feliz se descobre Guardando segura Na mente e no peito A imagem tão nobre A bela figura O porte perfeito Da doce cunha Da doce criatura, Iracunhã. Perdido de amores À sombra deitado O céu contemplando De nuvens tomado Qual flocos de lã Ao sol da tardinha Se esquece das dores E vê, fascinado, Sua doce indiazinha, Iracunhã. Na mata sozinho Pergunta ao vento: Por que só agora? Por que nesse tempo, Com o corpo desfeito. Por que não outrora Que, com alento no peito Caçava, pescava, Lutava com afã? Por que nessa hora? Por que, oh Tupã? Só agora a miragem Da doce Selvagem, Iracunhã? De que vale o canto das águas Entre as pedras limosas do rio? E o estrondo da catadupa? Se o sabiá geme suas mágoas Se trina, alegre, o canário, Se chora triste a jaçanã? Um som apenas escuta E ouve, quase em delírio A voz meiga, entoada, De sua doce Iracunhã. Quando o vento sopra, sereno Espalhando o perfume das flores E a abelha, tonta de ciúme Beija a flor numa orgia pagã A despeito de tantos olores Só sente, ama, o perfume O perfume suave, ameno, De sua doce Iracunhã. E ao deitar o corpo exaurido Numa prece pede a Tupã: - Que os deuses de amor imbuídos Aliados a Jaci, tua irmã, Te protejam dos fluidos medonhos Emanados do vil Anhangá. Te revejo, talvez em meus sonhos Onde sempre, sempre estás, Ou nas nuvens efêmeras, douradas Pela luz do sol da manhã. Minha doce querida, minha amada Minha doce Iracunhã |
Por Flavio Pinto - 22/11/2006 13:04:39 |
PALMEIRA DA MINHA TERRA Ah, Velha Palmeira ! És mais respeitada e falada, muito mais agora, do que aquelas outras, famosas, de Gonçalves Dias, eis que, muito antigamente - quando do mar vinham caravelas trazidas pelo vento – nelas, só, e apenas, cantava o sabiá. E aqui hoje, já bem longe no tempo e do mar, quem vos canta são os poetas de todas as gerações, nestes longínquos e românticos gerais de Guimarães. Cinqüenta e oito anos se passaram e até hoje sua morte ainda provoca fascínio e mistério nessa lira maravilhosa de ontem e d’agora. E linda, ela continua lá, na Praça da Matriz, fora do jardim, como bem mostra o retrato antigo ao ser lhe aplicado um moderno “zoom”, com seu passado e sua glória de ser a protetora de quem a procurou para não morrer, participante ocular da aguerrida história de nossa gente. Na velha praça, em frente à casa que a acolheu, viu nascer, e que um dia, por razões de somenos, pediu suplicante a sua morte, esqueceram-se do Velho da Palmeira, Camilo Philinto Prates que ali ficava, à sua sombra, meditando coisas da política e como fazer a nossa própria história.. Paira, entretanto, uma dúvida, posto que sobre o seu nascimento, 25 de novembro de 1872, plantada pelas mãos do Cônego Chaves, nunca houve nem mera sombra de discordância. Qual seria o exato ano em que, a vis machadadas de vândalos, inicialmente lentas e depois com vigor de profissionais, ela, tristemente, transformou-se em lenha e depois, para alegria do futuro, na poesia eterna de João Chaves? Nelson Vianna, em seu livro “Serões Montesclarenses” foi esclarecedor, tanto na data do nascimento, quando da sua morte : “...foi plantada na tarde de 25 de novembro de 1872 uma palmeira. Era linda e enfeitava a praça com suas verdes palmas, com sua elegância fidalga, até a tarde de 18 de fevereiro de 1948, quando foi sadicamente sacrificada por mãos profanas.” Virgínia Abreu de Paula, com sua acuidade e determinação – que respeito muito – no estabelecimento da verdade histórica, coloca dúvidas sobre a data da morte, conforme suas palavras, ao resolver “... investigar mais alguma coisa num caderno de meu pai , onde ele rabiscava notas que nunca foram publicadas ”. E a data da derrubada, de acordo com a linda crônica não publicada de seu pai, passou a ser 1949, a pedido de uma senhora cuja casa estaria ameaçada pela Palmeira. Sem este acesso privilegiado, familiar, restou-me, pobre e curioso mortal, recorrer, também, ao seu saudoso pai , Hermes de Paula, nosso mais talentoso historiador cujo livro “Montes Claros, Sua Gente e seus Costumes”, edição de 1957, que guardo e conservo com o maior carinho, é até hoje, para mim, a mais fidedigna fonte de pesquisas dessa nobre história montes-clarense. Na página 384, deste magnífico livro, no capítulo intitulado “Miscelânea Histórica”, Dr. Hermes escreveu o seguinte texto : “Em fevereiro de 1948, O Prof.Athos Braga, vice-prefeito em exercício mandou derrubar o velho babaçu plantado na praça Dr.Chaves e que ameaçava cair na casa do Sr.José Barbosa Neto. Isto deu motivo a muita crônica e poesia, lamentando o ocorrido...”. Abraços a todos Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 2/11/2006 14:47:56 |
PARA UM SAULO Os especialistas da nossa história invocados pelo brilhante muralista de codinome Saulo (ou será um prenome de vida própria, propositalmente dispensando sobrenomes, como se fosse um meio mistério de um quase anonimato para afastar possíveis maus espíritos ?) não apareceram, para oficiais pareceres sobre a sua afirmação e convicção da real existência da Palmeira não menos, vista na bela foto da Praça da Matriz, dos anos quarenta : “Perdoai-me a ignorância. Mas, parece que a palmeira da foto é mesmo a “Palmeira Antiga”, que João Chaves alçou aos céus em letra e música belíssimas... Por favor, chamem os especialistas (mens.17927, de 25.10.2006)”. Passados vários dias e não se vendo nenhum especialista ao largo ou à vista, sou obrigado- e com prazer - a lhe dizer, caro Saulo (que não conheço, mas admiro os belos escritos, de letras, vírgulas e pontos que saem direto do coração) que: como a foto, comprovadamente, é do começo dos anos quarenta ( se fosse do final, ou na virada da década de 50, uma possível nova palmeira plantada nunca estaria daquele tamanho), não há dúvida alguma na veracidade de sua afirmação, ainda mais ao se citar a história, pelas mãos e talento do Mestre Nelson Vianna, em seu excelente livro “Serões Montesclarenses” : “O mirante localizava-se no largo da Matriz (...) e à frente dele foi plantada, na tarde de 25 de novembro de 1872, uma palmeira. Era linda e enfeitava a praça com as suas verdes palmas, com a sua elegância fidalga, até a tarde de 18 de fevereiro de 1948, quando foi sadicamente crucificada por mãos profanas. Por aquela ocasião, o poeta montesclarense João Chaves, que lhe consagrava verdadeira afeição, vinculada a ternas recordações da infância, dedicou à velha palmeira uma inspirada poesia de fundo sentimental, que vai abaixo transcrita”. PARA OUTRO SAULO Encontrei-me, na saída de um boteco, semana passada, com outro Saulo, amigo de infância e contemporâneo de natação na Praça de Esportes : “ Flavão, o forte da minha carreira esportiva foi a natação, v. sabe disso. Fui várias vezes campeão e recordista mineiro, nado de peito. Tem tudo registrado na Federação Mineira. Fui goleiro por acaso. Fala pra Berguin”. Nosso grande Lindemberg, ao colocar um abrupto final à carreira esportiva de Saulo, o Bill, aqui neste mesmo Mural, após sua breve, porém gloriosa passagem defendendo a meta do BENJAMIN, do inesquecível Irmão Leonardo, grande professor e mentor que tivemos no Colégio Marista, e que teve no próprio Saulo, este, o Wanderley, o seu derradeiro e grande amigo, está, portanto, lhe devendo essa ressalva. Quanto ao Bill goleiro, está sendo modesto: pode até ter sido por acaso, mas era difícil marcar gol nele. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 24/10/2006 17:02:32 |
SEGREDO ANTIGO Todos os pontos misteriosos do A ao Gê, da moça, tinham se revelado naquele momento de êxtase. Pois os gritos que ela dava na madrugada chuvosa de segunda para terça-feira, sibilantes agudos e malevolentes graves, praticamente nos anestesiaram e nos levaram para outra esfera de compreensão durante quase quinze segundos, em plena Rua Quinze, no escurinho de uma vitrine recuada da loja de Ramos & Companhia naquele final de 1958. E nós, três meninos de 13 anos, nem tão inocentes e puros assim - pois que a rua Lafaiete, que era logo ali, já e sempre nos havia mostrado coisas a mais - nunca havíamos visto semelhante fato ou similar, nem no cinema, nem na escola, ou em livro - ou mesmo no salão de barbeiro, onde os adultos falavam coisas que pensavam que a gente não prestava atenção - só pudemos ficar assistindo, tanto ou mais entusiasmados que a própria moça que gritava de amor. Que, percebendo nossa presença, subiu abruptamente a saia, desatracou-se da pessoa e saiu correndo. Dobrou a Dr.Veloso, sem olhar pra trás. A outra pessoa, trajando uma parda e molhada capa de chuva e chapéu de shantung enfiado na testa, logo passou à nossa frente e deu-nos um olhar de pura decepção ( ou raiva ), com aquele grandes olhos azuis e sobrancelhas bem aparadas, tornando maior a nossa incredulidade ante tal fato. Pois não é que era também mulher o que achávamos ser o namorado. Chocados, ficamos como bobos na esquina, sem conversar nada. Decidimos não contar nada a ninguém. E ficamos assim, quase que num mórbido silêncio, por semanas. Só comentávamos entre a gente. Até que um dia, Zeca do Correio, com toda a sua verve e natural compreensão de todos os mistérios da vida, sentou-se perto da gente e arrancou-nos do peito o segredo. E só falou isso: “Roçadinho...Liga não. Pegou o pacote de cartas para entregar, levantou-se calmamente e saiu assobiando o famoso dobrado “Stars And Stripes Forever”, o prefixo musical das matinês do Cine São Luiz. Sem pular nenhuma nota. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 9/10/2006 10:58:21 |
ELEGANTES RACHADAS O povo daqui dessas faladas alterosas, pelas redondezas e adjacências, d’alhures, acolá ou mais não sei de onde, e todos aqueles que o detestam, seu cheiro, sabor, histórias, mentiras e verdades, gostam de chamar os que gostam de pequi – alguns carinhosamente e outros nem tanto - de roedores, como se ruim e animalesco fosse a prática dessa eterna delícia, que é roê-lo até ficar branquinho e começar a aparecer as pontinhas dos espinhos. Claro que, indelicadamente, tenta-se aí (não por todos) uma forma de rebaixamento qualquer, por fora das entrelinhas. E ficam sempre surpresos de não haver nenhuma reação da parte do povo viajante das terras quentes do norte, até pensando que este faz grande esforço, para não retrucá-lo, ou ficar chateado. Mera educação. Até que, num dia qualquer de suas miseráveis - e completamente sem graça e sem sal - vidas de gente que nunca comeu pequi ou tomou suco de umbu, percebem que nunca existiu força ou vontade pra contrapor quaisquer más respostas ou mesmo feridas nos pretensos sentimentos agulhados de nossa sensibilidade. Mera piedade. Porquê ? Dirá o incalto. Que é este mesmo incauto, eterno imprudente , só que ligeiramente - ou inteiramente - tonto, com a língua aguçada e a cabeça sempre vazia. Em qualquer bar dessa gostosa e verdejante capital, ele existe. E em tal conversa que os padrões normais existentes para uso comum (futebolísticos e políticos) tornam-se escassos na verborréia afiada dos referidos e sistemáticos roedores, quando cruzam velozmente as fronteiras do absoluto desconhecido, bem pra lá de onde Judas perdeu as meias. Embora sejam, nada mais nada menos do que o encontro de amigos e conterrâneos, aquela velha conversa gostosa, aliás e sempre, boa de doer, cheia de casos. Todo dia um caso novo.E suas nuances, de rir e chorar ao mesmo tempo. Os olhos, à toda hora, molhados da mais pura emoção. É quando tem sempre um desses por perto, incalto , bêbado, pseudo membro da ‘inteligentzia” local, louco para adentrar à transcendental conversa do povo do sertão.E derrubar. Ou tentar. E, como sói acontecer, nestas grosseiras e vãs tentativas de ocupação do ego alheio, sobra sempre para este alguém sabe quem : acaba não se dando tão bem como pretendia, que nem o próprio Freud explicaria ou sairia por cima. O incauto, então, já menos tonto, naqueles 30 segundos de recomposição geral e estratégica, dá solene meia volta e, no sentido totalmente contrário , navega em direção a territórios de outros povos existentes - a lugares mais fáceis e razoáveis, de preferência - na face oculta do belo boteco. E o ultraje, que a rigor, não é nada disso, muito pelo contrário, fica na lembrança. Certamente, mais na dele do que na nossa. Abraço a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 21/9/2006 10:17:16 |
A NOITE DO MEU BEM Eternos sobreviventes anuais. Diários e mensais, está implícito , não vale a pena contar. Basta vivê-los. Somos sim e muito mais, esta fina flor do norte e cerrado, gente simples, de fibra, do ano corrido do trabalho sol a sol, que segue a trilha da batalha do início de uma safra a outra de pequi - embora malfadados anões temporões apareçam ocasionalmente para nos desviar da rota certa - agüentando tudo calado, ora feliz, ora triste, mas sempre livres, nosso direito. É quando se aproveitam dessa infinita bondade e paciência anunciando, a toques de ensurdecedores clarins elétricos, que o preço do progresso e do prazer é a eterna escuridão e que a luz só aparece mesmo no final do túnel. E para alguns poucos : aqueles que se submeterem, sem reclamar, às cruezas e incertezas desta maléfica caminhada, onde, em nossos olhos, ouvidos e mentes, perenes coisas ruins têm obrigação de passar e repassar, para que o completo desfrute venha no final e paire eterno sobre a velha cidade. Parece até antigas aulas de religião. Mas não é. É o momento presente, de quem só faz piorar a vida de todos, ano após ano, azucrinando-nos em nossa própria casa, interferindo no merecido e sagrado descanso das lidas sem fim. Debaixo da complacência e benesses de um poder colocado para olhar por nós. Que nunca oram pro nobis. Mas ficam bravos, até com os incomodados que se retiraram. E com os velhos e as crianças, que só queriam dormir o sono de paz cantado por Dolores Duran. Abraços a todos Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 14/9/2006 12:59:34 |
COISAS QUE FALTAM A verdade é que está faltando alguma coisa pra alegrar a vida do cidadão. Do velho e do novo. E dos mais ou menos e até dos que se acham bem menos do que mais. Quem vai nos devolver aquela velha caminhada , despreocupado da vida, pelas esquinas e ruas da nossa velha cidade? As pessoas andando pelas calçadas, no vai que vem, natural , os rostos conhecidos dos amigos e semblantes misteriosos de desconhecidos. E ver de perto o amor nos olhos dos casais. Dos cumprimentos e abraços nos mais chegados ou simplesmente parando pra tomar um cafezinho no bar e perguntar pela saúde do velho dono, e dos filhos, e dos fregueses e pagar um cigarro retalho pra alguém que a vida nunca sorriu. Do silêncio da natureza e dos sons da cidade. Acústicos. De um enterrar de um pé numa poça d’água, de poder se ouvir um carro , ao longe, pegando empurrado. E o som rasgado de uma campainha de bicicleta (de apertar com o dedo e com força). Uma mãe, aflita , gritando embaixo de um pé de manga-rosa : “desce daí menino enfuzado!”; De passar na porta da casa da aula de datilografia, ouvindo “remingtons” e “olivettis” sofrerem nos dedos dos aprendizes até alcançarem frêmitos sons de metralhadoras , a tarde inteira . Do som do apito da fábrica tocando nas horas certas para ferir ouvidos de incertas amadas, fazendo nos virar o próprio e grande Noel. Essas coisas, e outras mil, estão faltando. E a minoria, nunca silenciosa, sabe. Abraços a todos, principalmente para o amigo Maroto, colega de carteira da sala do Irmão Geraldo Damasceno e de recentes trilhas gonçalinas. E, para “eu fiz um A, eu fiz um Ene...”, sempre ao lado, também. Mais que justa a homenagem. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 31/8/2006 12:01:11 |
TROMBONE Somos agora , oficialmente, a grande minoria da cidade. Porém, nunca silenciosa. Somos grandes - e orgulhosamente - trinta e nove por cento contra pequenos sessenta e um de uma maioria pseudoconsolidada pelos números. Que não mentem (não?) ! Taí , de papel passado, no jornal e no ar, ciberneticamente para todo o mundo e espaço sideral. Até um planeta, em sinal de protesto, pediu as contas e foi embora do céu. De vergonha. (Quem sabe chega até perto dos arredores onde Deus mora e Ele dá uma ajudinha pra gente ?) Ganhou, então, a maioria, a mais interessada, a mais inserida no contexto, a mais progressista e a mais preocupada com o futuro de cidade grande desse sofrido Arraial das Formigas de Antonio Gonçalves Figueira. Maioria que agora ri da nossa petulância de querer afrontar o poder da riqueza que constrói. Abaixo o amor, a poesia, a amizade e a boa vontade. Viva as latas, as coisas elétricas e o falso cheiro de rosas e jasmins dos detergentes e purificadores de ar. Sim, somos a minoria, aquela pérfida e retrógrada que quer manter fielmente a tradição e o folclore do jeito que o povo fez ; os pés de pequi na terra que nasceram e floresceram , e as águas dos rios em seus leitos, sem que sejam sugadas por ávidos pivôs e fingidos carneiros mecânicos para molhar o pasto de quem já derrubou todas as árvores frondosas e fez a chuva passar adiante, procurando outros lugares. Amenos e serenos.Poetas e sonhadores. É o que somos. E temos orgulho de sê-lo. Ora viva, ora reviva , viva São Gonçalo, viva. Abraços a todos Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 29/8/2006 15:14:20 |
FILMES NA GARAGEM DA RUA DE TRÁS – Parte II-final (continuação de 14.8.2006) Continuando, meus caros leitores (porque promessa é dívida) ... Vários pequenos filmes continuaram sendo feitos, sobre todos os assuntos possíveis. Até um documentário fizemos. Lindo. Sobre a vida especial dos animais selvagens. No caso, baixando um pouco nossa bola, da especial vida dos animais domésticos, que também tinha seus perigos e mistérios. Ficamos quase uma semana esperando aparecer um gato de rua, que volta e meia entrava no quintal , aliás, Estúdio da Garagem da Rua de Trás, mais precisamente na cozinha de D.Ruth, mãe de Alberto. Atacava a despensa, roubando até as carnes de sol penduradas nos fundo, perto do fogão de lenha. Primeiramente, achou-se que era um rato. Mas, certa vez todos nós vimos o felino, cinzento, cheio de listras brancas, sair com uma manta de carne na boca. Foi seu azar. Apesar do desagradável fato de ser sobre um pobre gato ladrão, a peculiar e divertida utilidade de tê-lo como grande personagem principal, valia o sacrifício. Ficamos uma semana na espreita, na tocaia do bicho. Alberto, com a câmera preparada, Chico Bóia com a tábua dos fios pelados e as três lâmpadas da iluminação pronto pra ligar na tomada, e eu, segurando Huckeberry, o pastor alemão, com ordens de soltá-lo quando o gato aparecesse. Até que um dia, de tarde, o danado apareceu, cheio de finesse e sutilezas no andar e entrou na cozinha . Quando ia saindo, com uma coxa de galinha na boca, Alberto gritou: “solta o Huck, solta o Huck...” Não precisou falar três vezes ( reclamei que ele tinha que ter dito “ação” ,antes. Ele rosnou de volta não-sei-o-quê , eu falei “tá bom””, continuamos a filmar). O Huck deu um bote, o gato deu um meio pulo, de lado e só o rabo ficou na boca do cachorro. Alberto filmando, nós atrás , até que o coitado - que era só aflitos e esganiçados miados - pulou o muro, ganhando a rua e a liberdade. Graças. Para ele e para nós, esbaforidos e atabalhoados, atrás dele. Ainda o vimos, ao longe, correndo , sem olhar nem pro retrovisor, até sumir em direção ao Rio Vieira.Nunca mais fiquei sabendo se ele apareceu de novo.Nem para buscar a ponta do seu rabo, que deixamos dentro de uma caixa de sapatos, junto às relíquias do estúdio.(Será que ainda existe alguma coisa?) Depois deste documentário desanimamos um pouco, até mesmo por falta de assunto, creio. Ou talvez esperando chegar o tempo das chuvas. Era um milagre, este tempo de chuva. A gente ficava mais alegre com tudo acontecendo e florindo. As mangas Ubás começando a amadurecer e o cheiro de pequi cozido , no ar, rondando, vindo de tudo quanto é lado, nas horas de almoço, em que cada um ia pra sua casa. E lá eu ia perder o arroz com pequi de D.Luiza ? Num dia daqueles , de fim de ano, o Diretor chegou mais na turma, todo feliz, dizendo que tínhamos uma nova produção. Quase gritava, eufórico : - Um épico...Grandioso...e vai ter de tudo. Piratas, índios cowboys, gangsters, tudo, tudo, tudo! E de final diferente. Todo mundo morre, não sobra ninguém. Chega dessa moral burguesa que só os maus morrem. Todo mundo morre, até os bons. E meu filme, vai ser assim, como na vida. Nós nos entreolhamos, preocupados e ele arrematou : - É...mais no final...aparece Nossa Senhora e dá um beijo em todo mundo que foi bom. E sentenciava, olhando para cima : E só os bons voltarão”. Foi quando nós entendemos que aquele filme ia demorar demais. Até hoje . Abraços a todos, especialmente à querida e talentosa Ruth Tupinambá Graça, pelo seus noventa anos de grande sabedoria, que nos viu de perto toda uma vida, e ao longe , com aquele seu sorriso de irmandade com D.Luíza, sempre nos protegendo, junto a Alberto, Márcia, Norma, Ester, Armeninho e Nara. Saudades do Tio Armênio. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 14/8/2006 18:35:00 |
FILMES NA GARAGEM DA RUA DE TRÁS ( Parte I ) A garagem vazia e a inesquecível caminhonete “International-Harvester”, ano 47, na fazenda ou na loja perto da Praça de Esportes, felicidade geral dos meninos da Rua de Trás. Era a conta para que ocupássemos o nosso estúdio cinematográfico. Cinema e teatro ao alcance de todos. Mais uns poucos metros de quintal ao lado, com destaque para um glorioso pé de manga Ubá, ou Coco como queiram ( só sei que era a manga mais gostosa do mundo), nós tínhamos tudo . A bem da verdade, o “nós” aí colocado vai com um certo exagero : éramos apenas co-participantes, talvez sócios minoritários sem direito a voto, diga-se, meros entusiasmados atores, tanto bandidos como mocinhos, produtores e continuístas ocasionais , pois quem mandava mesmo era o nosso amigo Alberto, o grande diretor do estúdio da garagem da Rua de Trás . Graça no nome e méritos , já os tinha todos, para dar conta de tão bem lidar com a sétima arte. E assim seguiu sempre na vida : sempre caçador e vencedor na própria trilha que escolheu, deixando o dia da caça para quando quis. Senão bastasse isso, o maravilhoso quintal e garagem, a incrível câmera 8 milímetros alemã (não lembro a marca) , os cenários, as fantasias e mais do que tudo, as idéias (e que idéias !), todas eram dele . Quando chegávamos para as filmagens, até os diálogos já estavam prontos. Apenas um breve ensaio e começava-se logo o filme. Luz, câmera , ação. Sentado na cadeira de lona - com seu nome escrito atrás com giz - ou com a câmera na mão, sério e concentrado, dava as ordens. Em clássico estilo ligeiramente italiano, mais pra Vitório De Sica e Roberto Rosselini, embora no neo-realismo do nosso jeito, ou melhor, do jeito dele. A meninada da vizinhança podia participar como extras e fazia-se fila no início das filmagens.Era uma festa . Grátis, ou melhor, um pagamento simbólico, qualquer manga que caísse do pé era de propriedade dos extras e artistas, desde que Huckleberry ( mais conhecido como Huck), o pastor alemão da casa, não a pegasse primeiro. A claquete ( feita pelo carpinteiro da fazenda, o mesmo que fazia e consertava os carroções de boi) fechava, sem dó : Cena 3. A partir dessa hora vivíamos um verdadeiro pandemônio. Chico Bóia na iluminação ( três lâmpada pregadas num caibro de madeira, ligadas num fio de cinco metros, escalpelado pelos dentes do cachorro, Huck, não podia nem passar perto de poça d’água que dava choque). A Cena 3 : Claude Bello, deitado , agonizando , após levar um tiro num duelo do século dezenove, segurava o riso. O barulho do tiro vinha de um traque dentro de panela velha de ferro fundido, colocado por Zé Chitimite. Só que ele tinha (pura sacanagem) acendido uns dez de uma vez só e jogado tudo dentro da panela. A cena precisou ser refeita . Alberto aos berros: “Ele morreu de um tiro só, pô, não foi de metralhadora não ! Alguém ao lado, curioso, pinicava : “Mas, Diretor, o filme não é mudo? Tanto faz, então, o número de tiros”. E Alberto parava tudo, olhava firmemente nos olhos do interlocutor (que à esta hora já devia estar arrependido de ter falado alguma coisa) e dizia (pensando na posteridade , claro) : “ A boa intenção só vale se tiver um fundo de verdade”. Todo mundo batia palmas para a genialidade do comandante e tudo voltava à normalidade. Aí , começava-se tudo de novo.E toda a semana, tinha um filme diferente . Nós naquela mão de obra. (Aguardem o próximo capítulo. Soon. Neste mesmo espaço) Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 13/6/2006 09:45:33 |
A ERA DO RÁDIO No tempo do rádio, as emoções da Copa do Mundo eram outras, bem diferentes das proporcionadas pela televisão. Quem viveu (e ouviu) , dirá. Não me arriscaria a dizer que melhores. Nem iguais. Simplesmente, outras. Talvez a grande vantagem (ou diferença) era que, pelo rádio, tudo que rolava dentro dos mais longínquos gramados nacionais, se filtrava na imaginação de cada um, por este interior afora de um imenso Brasil, acompanhando seu jeito e maneira de ser e transcendia todos os limites e fronteiras da Terra ou espaço infinito , onde todos os planetas e estrelas tornavam-se palcos naturais da grande arte brasileira de bem saber jogar futebol. Mais ou menos como se vê nas propagandas da Nike (acho que copiaram nossos sonhos) : a bola indo e voltando, na ligeireza de um pensamento, de um ponto a outro no Universo, levando paz e alegria para todos os povos. E só o rádio - porque na tv mostram o que querem que se veja - conseguia passar tudo isso, dando asas à imaginação de todo um povo que parecia estar longe dos conhecimentos da Corte. Só parecia, Deus seja louvado. A história depois nos contou. As jogadas, os gols e os dribles independiam do tamanho da verborréia especializada dos irados locutores que , honra seja feita, se esforçavam ao máximo para nos contar em detalhes a simples realidade. Só que a realidade deles estava bem abaixo do que sonhávamos. E ali mesmo, na Rua de Trás - velho palco de tudo - após cada jogo, tentávamos, não totalmente em vão, fazer o que nossos ídolos realizavam em campo. Só valia gol bonito. Pra começar. Matar nos peitos, com elegância, uma bola cruzada e com o calcanhar dar um chapéu perfeito num adversário, para depois emendar um tremendo de um sem-pulo, estufando as redes e levantando a multidão. Multidão esta - ali na nossa rua - de não mais que duas funcionárias municipais varrendo-a com devoção, tagarelando sem prestar atenção a nada e , a compor o décor de uma cena antiga, modorrentos carros de boi, um após outro, rangentes e demorando a passar, a bola ciscando debaixo dos animais que teimavam em chutá-las de pata em pata, parecendo não querer devolvê-la. Ou, se goleiro fosse, como o lendário Tony Bufão (só de vez em quando aparecia no Larguinho , mas lá deixou sua marca de goleiro voador), e fazer uma acrobática ponte, à Pompéia (antigo goleiro do América do Rio, que foi seu grande ídolo), voando , naturalmente, como se fosse um livre passarinho, até o inatingível ângulo contrário e espalmar a bola para escanteio. Melhor do que isso, sempre nos disse o mesmo Tony, era defender, na ponta dos dedos, um pênalti, no último minuto. Suprema glória, principalmente se aquela linda moça dos seus sonhos estava passando na hora. Aí , valia todo o sacrifício, por que goleiro apaixonado que se preze mergulha no cascalho por qualquer bola rasteira, arregaçando braços, joelhos e cotovelos. O mesmo acontecia com candidatos a futuros artilheiros que, diária e sistematicamente, enfiavam o mesmo dedão do mesmo pé - sempre machucado e enfaixado - na mesma pedra do meio da rua, para dó e desespero de todas as mães e tias existentes, pacientes santas milagrosas que nunca cansavam de nos curar num dia, para fazermos tudo de novo no outro. Ao apagar das luzes, que é a hora própria de se ouvir histórias, sempre aparecia alguém contando, de maneira diferente - mas sempre emocionante - a velha saga dos dois irmãos, ambos jogadores de futebol. Numa cidade longe, bem pra lá do sertão de Goiás, na mesma toada do “Chico Mineiro” : “um dizia : eu nasci pra pegar...e o outro : eu nasci para chutar...” Novela popular de dramático e inesquecível final, quando o irmão, goleiro, morria com a bola nas mãos, ao encaixar no peito o terrível petardo desferido pelo seu próprio sangue, na cobrança de um pênalti roubado. Todas as vezes que se contava esta história, tinha sempre um menino que chorava. E a gente caçoava dele , sem nunca contar que - pelo mesmo trágico pênalti - já tínhamos chorado também.... Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 7/6/2006 12:23:57 |
DE MULAS E JOVENS De vez em quando me dá um desânimo. Tanta água que já correu nestes rios, tanta poeira solta levantada nas estradas, tanto vento frio que já deu voltas em esquinas que ninguém nunca viu, tanta assombração que só apareceu pra quem quis, tanto nó seco em molhados pingos d’água , tanta pinguela escorregadia... São tantos os tantos, que não acredito nessa etérea bruma de pobreza de espírito vagando solta nos meus nortes. Será que os tempos e contratempos vividos foram todos em vão ? Ou foram só danças e contradanças ? Minha vontade é dar uma parada na primeira curva do caminho e esquecer pra sempre dessa eterna viagem à procura de um simples querer ser feliz. De birra, talvez só pra dizer : gente, onde fui parar minha mula ? Aí , entrar num boteco e pedir duas pingas: uma pra mim e outra para um santo padroeiro qualquer . Pode ser até o santo dessa gente que vive toda uma vida sem saber viver. Para ver se ele ora pro vobis. Sem direito à costelinha. . Mas , nem tudo está perdido , quando se vê Lili e Bê, na rima de jovens poetas, dando lições de cidadania : "Jovens interessados nas "velharias" que contam a nossa própria história e nos dão um alicerce para construirmos um futuro para várias gerações. ... Preservação...Futuro... O passado pode ser um elo com a eternidade". Como diz o Bala: alvenaria. Aí, me animo de novo e vou procurar minha mula pra seguir viagem. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 30/5/2006 07:50:10 |
AVENIDA , DE DONA VIDINHA E DONA DOCHA De manhã, bem cedinho , lá vinha o velho vaqueiro (acho que se chamava Luiz) montado na garupa de uma mula tordilhada, dois vasilhames de 20 litros, cheios até a tampa, um em cada lado da bruaca. Passava à esquerda do Larguinho e parava na Rua de Trás (bem em frente a casa de “Seu” Athaydinho e D.Aldinha) no meio da grande calçada de pedras. Devagar, com um indefectível cigarrinho de palha apagado na boca, ia atendendo a fila de empregadas, madames, meninos e meninas, cada um , democraticamente, com a sua própria vasilha na mão esperando a vez de ter o puro leite de todos os dias. Uns pagavam na hora, outros, da conta do fiado, ele anotava numa velha caderneta. De vez em quando não aparecia, a gente tinha que ir buscar na fonte : casa de Dona Docha, a dona da fazenda do leite e da manteiga – era só o que sabíamos, então - no meio da Avenida Coronel Prates. O percurso era pequeno e também tinha suas compensações, além do gostoso cheiro de café torrado e dos aviões da Panair, no ar. Por conta do espetáculo do trepidante esvoaçar e invariável lanche dos lindos pombos de Dona Vidinha Pires , grandes personagens daquela hora da manhã, se fartando à larga das sobras de palhas de milho, fubá e café do Moinho Indiano, espalhadas no meio da rua.. Quando, coitados, se tornavam fáceis alvos de implacáveis estilingues e bodoques. Nunca consegui acertar nenhum – minha pontaria era péssima - mas sempre ouvi falar de muito guisado à custa deles. Não me recordo se - nesta época da rua de terra - já existiam estas mesmas árvores que agora derrubaram. Acho que foram plantadas quando do calçamento. De paralelepípedo. Lembro-me dos postes de luz ,de aroeira, baixinhos, com pequenas lâmpadas iluminando as noites com um brilho meio amarelado, um tanto fosco, talvez para não incomodar a visão do céu e as estrelas ou o clarão dos plenilúnios de maio, quando os tocadores, os poetas e os cantores faziam a festa, a cada esquina ou janela de uma linda donzela. Ou mesmo (quem poderá desdizer ?) , por ordem da inesquecível Dona Vidinha que, além do maravilhoso pombal era também proprietária da luz elétrica da cidade e gostava de ver (e ter) todo aquele movimento passante e cantante em frente sua varanda. Colega de seus netos (pré-primário de Irmã Salete e primário das Irmãs Eloína, Blanda e Rosângela, no Coleginho,do Imaculada) ocasionalmente era convidado a ir lá, desfrutar – literalmente – de seu maravilhoso pomar que tinha as frutas mais variadas e gostosas daquele mundo. Desde que , em outras (e várias) vezes sem convite e por debaixo da cerca de arame farpado na divisa do Rio Vieira - tal qual metade da garotada das redondezas - já havia estado naquela maravilha de pomar, eu , sempre, quando entrava pela porta da frente, do jeito normal e civilizado, ficava um tanto ou quase ressabiado. Sentada na cadeira de balanço no alpendre da velha casa com um jardim na frente, prestando atenção a tudo e todos à sua volta , os netos pediam-lhe a bênção e lá ia eu, atrás, passando de liso. Ela me olhava por cima dos óculos e dizia sempre a mesma frase. Toda vez. - Cuidado para não comer jambo verde, Doutor Orlando. Eles dão dor de barriga ! E dava sempre uma grande risada, após me chamar pelo nome do meu tio. Depois, tudo mudou na velha rua. Dona Vidinha e Dona Docha - que Deus as tenha - se foram, o leite começou a vir da cooperativa num tonel de alumínio, numa carrocinha puxada por um burro e chamava-se vaquinha, com uma torneira atrás e um mostrador de vidro onde aparecia o líquido já pasteurizado, livre de todas as impurezas. Não precisava nem ferver, diziam. Mas minha mãe fervia. Logo, implicaram com a velha avenida. A Igrejinha do Rosário estava na mão errada da rua, o seminário atrapalhava o clero, as árvores envelheceram e os canteiros prejudicavam o tráfego. Perdeu a graça. Abraço a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 17/5/2006 11:36:53 |
DAS GERAÇÕES A minha geração, isso é a nascida no durante ou pós Segunda Grande Guerra, talvez tenha sido das últimas a usufruir daquela famosa infância tranqüila – tão falada e relatada – de cidade do interior. Pouco ou nenhum movimento de automóveis. Muita gente tinha até cavalos e charretes para circular pelas ruas – a maioria - sem calçamento. Assim foi em Montes Claros, como deve ter sido em outras cidades pelo Brasil inteiro. Como eu nasci aqui, graças a Deus, só falo daqui. Quem quiser que fale da sua. E não quero dizer com tudo isso que a minha infância foi melhor do que qualquer outra, pois quando se é criança, em qualquer tempo ou lugar tudo é mágico e maravilhoso. Seja em outro século na beirada de um rio sem poluição pescando piaus, com as unhas sujas de cavar o chão à procura de minhocas, ou num cibernético Shopping Center, todo limpinho, de tênis Nike e cabelo explicado, comendo cheeseburger e ficando - de leve - com mil garotas ou jogando games que desafiam qualquer inteligência normal. Desde que você tenha uma família e haja amor e carinho nela. Se não, fica difícil, e repetimos, em qualquer tempo, era ou lugar.. As mudanças acontecidas no pós-guerra, advindas das invenções desenvolvidas rapidamente para o esforço de guerra, principalmente pelos alemães e copiadas pelos aliados , foram, uma após outra tomando conta do mundo e o que antes parecia impossível, passou a fazer parte do dia a dia de qualquer cidadão. Onde você, irrequieto garoto do começo dos anos cinqüenta , em plena matinê do Cine São Luiz, assistindo Flash Gordon no Planeta Mongo, via o Dr.Zarkov falar com Dale e o Príncipe Barin, de outro planeta para a Terra - com as imagens aparecendo num visor, simultaneamente, a milhares de quilômetros de distância - poderia imaginar que um dia faríamos igual ? Ou melhor ? Hoje , com a “webcam”, qualquer criança senta no computador e fala daí do centro da cidade ou do Alto dos Morrinhos para Bangladesh ou Marrakesh, sem miséria e com muita imagem. Só não fala pro grande George Harrison porque ainda não inventaram essa. Sem falar da nossa 98 , de onde mando um alô , agora , para todos os montes-clarenses espalhados pelo planeta. E um abraço. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 9/5/2006 06:01:29 |
RUA DA FÁBRICA, JATOBÁ E ESTRELA...ADEUS, ADEUS ! Mexem e remexem na minha rua da saudade. Que seja, então, feita a vossa vontade, senhores da razão de qual será o mais certo futuro e das afiadas respostas para tudo e sobre tudo. Mesmo que elas representem apenas o vazio do simples nada de uma faca sem cabo e sem lâmina. Que se deixe, então, o dragão de aço jogar ao chão todas as velhas árvores com seu humilde (e único) sonho de grandeza : um muito de diária beleza para moradores sem nenhuma paixão e um pouco de sombra para um apaixonado menino eternamente à espera de sua amada. A mais linda de todas. Ao vento, suas flores, pétalas e perfume dirão a verdade ou não, a possíveis passantes estelares da hora e do tempo : ali existiu mais que um passado, um iluminado palco de grandes e melhores cenas de gerações. Mas, nada a temer, se são apenas pedaços de saudade que se vão. E saudade não vota. Apenas volta, a cada curva do caminho. Se não há escuta, nem mais para as vozes vindas das estrelas, eles, os poetas, quais solitários guerreiros de lança e espada em punho deporão as armas e poderão até, momentaneamente, saírem vencidos na inglória peleja contra a intransigente magnificência perpetrada pelo poder : máquina acima do homem. Moderna insensatez de gente de pouca crença, rezares e viveres. Mas, eles, os poetas, sempre voltarão, principalmente os que falam com as estrelas. Um dia o povo ainda haverá de ouvi-los. E se manifestará, nesta terra de eterna inconfidência. Que não seja nunca. E nem tarde. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 4/5/2006 17:20:23 |
LALAU, LILI E O LOBO A gente olha para a foto do Juiz Lalau publicada no Portal da 98 e fica até enternecido com o olhar singelo e a carinha boa dele. Parece até um Bispo - daqueles bonzinhos de outrora - pronto para falar, santa e solenemente : “Deus te abençoe , meu filho”. De quando a meninada fazia fila na saída do Palácio pra ganhar santinho. Estudei minha infância inteira com o livro “Lalau, Lili e o Lobo”. Nem o Lobo era ruim, pois era o nome do cachorro de estimação da família (aliás, da casa da vovó) que havia fugido da fazenda e eles (Lalau e Lili) passam metade do livro procurando-o. Aquela linda viagem de Maria-Fumaça para a fazenda, com todos os colegas da classe, olhando a paisagem pela janela do trem. Lembrei-me agora, o coração chegou a doer de saudade.O refrão “passa boi, passa boiada” acompanhando e dando ritmo. Sem saber ou querer, o mais puro Villa-Lobos. Depois, no campo, o nadar nos rios e cachoeiras, o ver tirar leite nas vacas e cutucar bichos de pé, tudo retratado em simples desenhos e algumas poucas linhas explicativas, levavam-nos a sonhos e viagens sem fim, mexendo com nossa imaginação e fazendo-nos sonhar de olhos abertos em plena luz do dia. Nem o próprio cinema conseguia tanto. Inimaginável para os meninos de hoje, mas a pura verdade. Agora, as lembranças se quebram e se vão , revelando falsas estalactites de sabão numa grande caverna de sujeira que se tornou nosso querido solo pátrio. Solo pátrio. Era como o chamávamos, no pátio do colégio, de pé, mão no coração, cantando a plenos pulmões : Brasil, um sonho intenso, um raio vívido, de amor e de esperança à terra desce. Será que o Lalau é o mesmo. Ou fomos nós que mudamos ? Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 27/4/2006 12:26:10 |
UMA FESTA ATUALÍSSIMA Era uma festa sem precedentes na velha cidade. E quem bolou gabava-se até da criatividade do nome, quase nunca - ou pouquíssimo - usado na mídia nacional : Pós-Moderna. Aliás, Baile Pós-Moderno. Que beleza ! Cabeças coroadas , oficialmente convidadas, com todos os devidos "R.S.P." respondidos, exibiam seus convites à porta, diferenciados apenas pela cor : verde para “Formador de Opinião”, azul para “Politicamente Correto” e vermelho para “Outros” . Finalmente, após longos séculos de brigas, confusões, guerras civis e quarteladas sem fim, conseguiu-se definir, em apenas 3 itens, todas as classes e castas sociais, até as mais impuras e amaldiçoadas. O pessoal fazia fila na porta do Grande Local de Eventos ( clube para quê? Coisa do passado!) , recebendo cada um seu crachá, de acordo com a cor do convite apresentado. Crachá “F.O” para o verde, “P.C” para o azul e “OUT” para o último, aliás a maioria. Silenciosa ? Talvez. Cada mesa com suas bandeirinhas e cores afins: a verde sempre dividindo com azul as mesas da frente e a vermelha,embora fosse a maioria, nos fundos e sozinha, como sempre foi. Desde os primórdios. Os convidados iam se ajeitando de acordo com a sua cor (do crachá, claro, para ser politicamente correto) e logo se notou um grande silêncio. A orquestra parou de tocar e o dono da festa, ao microfone, lembrou a todos que aquela seria uma festa inovadora, realmente pós-moderna e... ...Somente os formadores de opinião poderiam falar e assim poder, sem interrupções, formar todas as opiniões. E também, os politicamente corretos que poderiam ( ou não) aprovar as cabeças feitas ali na hora. Foi quando se levantou um conviva , da turma dos “Outros”, com muita humildade e educação e perguntou o que os vermelhos fariam, enquanto se formavam novas opiniões e se analisassem as próprias dentro dos corretos enquadramentos necessários. - OUT! ...( óhoooooh...um grande sussurro, seguido de silêncio).... - Aliás, meu caríssimo representante dos “Outros” , apenas preste atenção e...(pausa para respirar e mostrar uma cara inteligente, formal e educada) fique apenas calado. Você e seus outros. Aprendam e apreendam o mais moderno do pós e depois (ainda me agradecerão) saiam daqui em paz para suas casas com a sua própria opinião formada. É tudo que queremos. Salva de palmas. Dos verdes e azuis. A orquestra voltou a tocar e os “Outros” começaram a dançar. Como sempre. Ao microfone, o crooner - com um crachá vermelho no peito – soltava a voz : “Prefiro ser essa metamorfose ambulante Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo” E lá de cima, Raul Seixas mandava lembranças. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 20/4/2006 10:25:36 |
FRIO, PAIXÃO E BACALHAU O frio que anda fazendo aqui em Belo Horizonte não está de brincadeira e faz-nos, dentre outras coisas, buscar alento em névoas e brisas presas no fundo de um baú das saudades perdidas e flutuantes. Parece até enredo de filme B, anos quarenta. Como sempre, dirão – acertadamente - os caros leitores. No alto do Anchieta, onde me escondo, congela-se até corações. Que o diga cá, este pobre meu, já meio paralisado pela visão que tive , outro dia, de uma linda participante daquelas auroras da vida , dos tempos que – infelizmente - não voltam mais, como disse o poeta. Ela passou, andando na calçada do lado de lá, os cabelos longos, soltos e revoltos, o vento frio a fazendo encolher-se e colocar as mãos nos bolsos do casaco. Cinematograficamente. Sorte minha que não me viu. A beleza e o enlevo da hora me tornaram apenas um velho tolo e mudo, sem palavras até para cumprimentos formais. Continuei minha caminhada, em direção ao Mercado Distrital, de olho num futuro esquentamento – qualquer - para fazer frente à súbita friagem e emoção que quase liquidaram meu alquebrado coração. Se é, doce devaneio, que tal providência material poderia curar males ocultos por loucas e desenfreadas paixões ! Pensando juntar uma costela de vaca com um bocado de aipo, cebola e tomate, e adicionar - no capricho – meu reservado tempero de Montes Claros, comprado da mesma pessoa há anos no Mercado Municipal (desculpem, mas esqueci o nome dela, da vendedora de temperos.Mas não tem problema. Aí estarei, se Deus quiser, em maio e procurarei sanar esta falta), ali na meiúca, entre os vendedores de andu e os açougues, encontrei-me com a famosa cozinheira portuguesa Terezinha Xavier, minha amiga de muitos anos e proprietária da Taberna Balthazar, ali na Serra. Caraça, esquina de Oriente. Por muitos anos, desde quando era apenas um meio boteco meio mercearia na Estevão Pinto, deliciei-me – junto com a querida turma imortal - com seus maravilhosos petiscos d’além mar, feitos com o maior carinho, que já lhe anteviam um grande sucesso no ramo da gastronomia, tarefa bem difícil de se levar nos magros tempos atuais. Ao lado, sempre e eternamente, meu grande amigo Aurélio. Aí, voltando ao Distrital, não sem antes me ensinar a melhor forma de fazer o caldo de costela, Terezinha me convidou para provar um novo lançamento da casa : bacalhau na abóbora, com queijo Minas, servido bem quente, saindo fumaça, acompanhado de um bom vinho patrício como se convêm nestas geladas e apaixonadas noites mineiras. Logo fui lá, no tal e benedicto bacalhau e... ...Mais as taças várias de um encorpado Periquita, esqueci-me, por indescritíveis momentos, dos ventos frios cortantes e suas misteriosas mulheres assassinas de incautos e frágeis corações, adentrando-me ao paraíso do bem comer e beber, antes terreno imaculado e indevassável de poucos imortais, hoje ao alcance de uma centena de assíduos e novos fregueses , felizes mortais, ora pois. Abraços a todos Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 9/4/2006 13:35:30 |
DE SEMANA SANTA , CARNAVAL, GENTE E DONA FINA Hoje em dia - e desde muito tempo - as cidades mineiras ficam vazias na Semana Santa. Com algumas exceções - Diamantina, Ouro Preto, Mariana, São João Del Rei, dentre outras - que cultuam santa e religiosamente as tradições e sabem da contribuição e importância deste sazonal turismo para a ativação do comércio e mercado hoteleiro/gastronômico da cidade. E, lógico, também espiritual, para os que crêem mais do que os outros, além de ser um motivo para os conterrâneos ausentes naturalmente se encontrarem.. Na Europa, principalmente na Espanha, a época se traduz em disputados e caros pacotes turísticos internacionais, onde visitantes do mundo inteiro aportam às suas tradicionais cidades , apenas para verem procissões e assistirem solenes missas ao som de belíssimas músicas sacras e cantos gregorianos, de fundo. Em Montes Claros, era assim e melhor ainda, posto que era de graça. A Praça da Matriz cheia da gente da cidade e de todas as cidades circunvizinhas, o discurso de Padre Dudu no Descendimento da Cruz, a procissão do Enterro ou Senhor Morto, o belíssimo canto pela voz da Maria Beú, a Verônica, a cerimônia de Lava-pés, onde o Bispo beijava os pés de doze escolhidos seminaristas, que tanto podiam ser do Seminário de Padre Pedro ou do de Padre Joaquim e vinham a pé, descendo a rua Doutor Veloso cantando - como bem explicou no Mural, outro dia, o nonagésimo oitaviano Saulo - em vozes afinadas, belíssimas, de quase crianças, com suas sotainas, de querubins, de serafins, especialmente a Ladainha de Nossa Senhora, em puro e legítimo latim, afinadíssimo : "Sancta Maria, ora pro nobis. Sancta Dei Genitrix, ora pro nobis”. Claro que,no sábado de Aleluia, a meninada alvoroçada e desatinada – leia-se Turma do Larguinho - empalhava e vestia de roupas velhas um maligno Judas, arrastando-o pelas ruas durante horas, até enforcá-lo ou queimá-lo em praça pública, sob aplausos de todos os passantes. Mil e setecentos anos depois, estão descobrindo que o Judas não foi tão maligno assim... E agora , garotos ? Por via das dúvidas, nada de malhá-lo este ano ! Porém, triste realidade dos dias de hoje, chega a Semana Santa, o povo some. Os mais entusiasmados (e abonados) viajam centenas de quilômetros em estradas esburacadas e perigosas para tomar um rápido e quente sol nas costas e uma cara cerveja gelada, em praias repletas. De mineiros e axé-music. De baianos não, por que sábia e preguiçosamente ficam dormindo nos feriados, para dar mais espaço aos visitantes que gastam. No Carnaval é a mesma coisa. Se v. quiser ouvir som de asas de mosquito batendo é só parar no meio da rua Quinze, ou em qualquer rua do Centro, nos dias dedicados a Momo. Vai escutar até o que não se quer. Depois, passada a folia, onde as velhas cidades e as praias faturam alto ( do bolso do montes-clarense), ficam,empresários tupiniquins - e afins - caçando confusão e arrumando carnavais fora de época , à guisa de correr atrás do prejuízo, para não fazer mais do que tentar conseguir atazanar os ouvidos e a paciência do povo. Por um mísero punhado de dólares... Sem nos esquecermos que colocam em risco a segurança da cidade, pois em sendo – na região - um evento único e anunciado, atrai , no vácuo e sombra das pessoas boas e bem intencionadas, uma multidão de espertos malandros, que nem o próprio batalhão de polícia – inteirinho - consegue dar jeito. Pode parecer uma crônica irada , contra o direito de cada um fazer o que quer ou a se querer ganhar dinheiro, coisa nada fácil na atualidade que vive hoje o país. Mas é apenas um breve chamado para refletir sobre o quanto se precisa dar mais valor à rica cultura e tradições deste nosso querido norte. Catrumanos que somos. E – em se falando de gente fina que dá o devido valor à nossa cultura e tradição - para dizer à Dona Fina, Virgílio e Virgínia , da felicidade que senti, de longe, ao saber da recente e maravilhosa apresentação (um amigo que viu e ouviu e me contou) do Grupo de Serestas João Chaves num bar da parte antiga e nobre da cidade, aquela que até hoje continua intacta em nosso coração. Gostaria de ter estado lá. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 5/4/2006 09:02:08 |
DE BUARQUE A SHAKESPEARE, SEM MEDO DE SER FELIZ Não sei se para todo mundo, mas a mim, particularmente, sempre me pareceu que as vacas – durante toda a minha curta e prosaica existência - foram (e continuam, infelizmente) magras. Falta-me, confesso, um dinheirinho sobrando, para umas viagens que não fiz - e gostaria de fazer - e umas pequenas melhorias na vida dos meninos. Mas tudo tem seu tempo, já disse alguém.E a gente vai levando. Sina danada de pobre feliz, se é que é aceitável, na sociedade dita organizada, esta complexa afirmativa de existir real felicidade na pobreza material. Por isso, desculpem-me, então, possíveis críticos e apressados analistas de comportamento, pois quero , antes de tudo, que saibam que nada se dirá aqui em favor da pobreza de espírito, esta, sim, sem jeito de se dar jeito, do início ao resto da vida. Vivam e durmam com ela , a quem de direito...E que Deus olhe por vocês. Só que, pela santa e salomônica sabedoria das compensações divinas, depois que o tempo - como bem disse um dia o grande Chico - vai passando, roda mundo, roda-gigante, rodamoinho, roda pião e rodou num instante nas voltas do coração - a gente começa a ver que, no fundo mesmo, elas, antigamente, eram mais gordas, simples e (porque não dizer ?) belas (ou pelo menos, pareciam) do que supunha esta vã e possivelmente tola filosofia hamletiana que me acomete e lhes repasso. Certo dia, na velha Montes Claros, no Bar São Benedito, a meninada vibrou, certa vez, com uma grande e inesquecível promoção : os picolés ali seriam vendidos a dois por quinhentos réis . Para o pessoal mais novo não voar demais , mais ou menos, hoje, cinqüenta centavos. Em todos os bares, Minas Bar, Big Bar, Sibéria e aquele da esquina da Praça Cel.Ribeiro, da mãe de Tony Colorido, continuava o mesmo preço : quinhentão o picolé. A gente ria - alegria pura - e espalhava a boa nova nos quatro cantos da cidade , fazendo fila na porta do São Benedito, cheio das portas de dois metros de altura, ali na esquina debaixo, na Praça Doutor Carlos, do outro lado do Mercado. Que maravilha, principalmente pra quem ganhava uma semanada de dois mil réis, que mal dava pro matinê no Cine São Luiz (ou Coronel Ribeiro) e um esperado e sagrado picolé, depois da suada sessão de bang-bang e seriado. Não sei se era Nioka ou a Volta do Sombra. Se bem que , devo dizer, os picolés de groselha, tanto os redondos quanto os retangulares, não agüentavam uma chupada profunda ou muito forte : logo passavam de um rosa claro inicial para um total branco gelo-água, antes de se chegar mesmo à sua metade. Mas ninguém reclamava, o calor e a sede eram os mesmos de hoje e chupar um gelinho era bão também.... Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 28/3/2006 12:39:37 |
UM CARRO DE BOI E UMA AVENTURA No rádio de cabeceira, madrugada de sábado para domingo, Tonico e Tinoco me acordando. “...Meu véio carro de boi, a sua cantiga amarga No peso bruto da carga, o seu cocão ringidor Meu véio carro de boi, quantas coisa ocê retrata A estrada a a verde mata,e o tempo do meu amor...” Como um fulminante raio em noite de trovoada, bateu uma saudade doida. Eu me vi em pé na rua Joaquim Nabuco esquina de Lafetá, menino de calça curta, com meu querido amigo Claude Bello, escutando ao longe o rangido do eixo das rodas, untado ininterruptamente de óleo de mamona, para justamente aumentar o ranger. Até fazer chorar. Nós e as rodas. Nossos corações disparados de aflição. Esperar carro de boi não era fácil, não ! Avistamos primeiro o sorridente guia, Toinho, à frente dos oito bois do lindo carro de seu pai, Seu Menê, todo alegre e acenando para saltarmos logo na traseira, ainda vazia, indo buscar cana para o Engenho do Pequi. E rangendo, chorando, rangendo, ele ia, devagar , sempre devagar... Cel.Prates, passando na porta do Café Indiano ( sinto até hoje aquele cheiro de café torrado), Diocesano, Colégio Imaculada, Fábrica de Tecidos Santa Helena, Santa Casa. Descendo e subindo ladeira, até o Seminário. Finalmente, chegávamos ao Melo e à cana “caiana” - da melhor qualidade – da fazenda de Nivaldo Maciel. Só esperando ser cortada e embarcada. Se a gente desse - a sublime - sorte do dono estar lá no dia, ele, com a maior das boas vontades, faria um aboio - de cinco minutos , contados no relógio - saudando os visitantes que chegavam. Até os bois ficavam encantados e diminuíam ainda mais o passo, para melhor ouvir tal maravilha. Enquanto os camaradas carregavam o carro, dois dos meninos de Nivaldo, Ronaldo e Murilo, sempre hospitaleiros como o pai, levavam-nos para os pés de manga. Não sem antes nos deliciarmos com um sem número de roletes de cana, cortados na hora. Depois, vinham as mangas-rosas, bitelas. A barriga chegava a estufar. E a volta. O carro cheio de cana, bem amarrada e segura e coberta com couros de boi, aboletávamo-nos em cima, sentindo-nos como verdadeiros aventureiros em caçadas de tigres nas florestas de Bengala. Pingos de chuva, a gente tirava a camisa e punha debaixo do couro curtido, a chuva aumentava e mais a gente gostava. Mais um par de horas, o Engenho do Pequi, meu tio Joanir Maurício fazendo festas à nossa chegada e estranhando a gente recusar o canecão de garapa que ele mesmo pegou na bica do engenho. Depois , sorrindo, ouvindo Seu Menê contar da quantidade de manga-rosa que tínhamos comido... Abraço a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 17/3/2006 11:29:55 |
DE UM GINÁSIO, LOYOLA & COMPANHIA Não fui do tempo do Colégio Diocesano. Nunca estudei lá. Infelizmente. Quando terminei o primário no D.João Pimenta, já o tinham transformado em seminário, quando então, radicalmente, transformou a nossa bucólica Rua da Fábrica num pequeno - assaz movimentado - Vaticano, como se fosse um verdadeiro e real filme de De Sica, onde, em dias de festa e procissão , entusiasmados aprendizes de padres passeavam em compenetrados grupos fingindo que não viam passar as lindas meninas do Imaculada. Mas , como era perto de casa , sempre vi e participei de tudo por lá : os disputados jogos contra o Seminário (batinas brancas, lá do Melo) de Padre Pedro no campo de futebol e as peças e sketches teatrais, levados semanalmente no prédio anexo, chamado de Congregação Mariana , onde também se realizavam grêmios estudantis e incríveis sessões de cinema grátis. Vagamente me lembro de, certa vez, uma acalorada disputa pela Presidência do Diretório de Estudantes de M.Claros (famoso DEMC, cuja sede era na Praça Cel.Ribeiro) que presenciei. Não me recordo quem ganhou ou perdeu, mas sei que meu nobre colega ( de letras e de Banco do Brasil) Wanderlino Arruda teve uma mexida qualquer na eleição.(Garanto que qualquer dia ele vai contar o que foi, na qualidade de mais novo nonagésimo-oitaviano da praça...) Quando era festa do Ginásio, sob os vigilantes olhares dos Padres Agostinho e Gustavo(que depois virou Monsenhor e adorava bater o anel na cabeça dos meninos que pediam benção), as sessões sempre começavam com o hino : “Colégio Diocesano, oficina que trabalha” . Só me lembro deste começo. Muitos filmes de cowboy, mudos, falados e registros particulares daquela fase da vida da cidade, estes maravilhosamente filmados em preto e branco ( 8 milímetros) pelo inesquecível Itajahy Borba, dono do Armazém Loyola que numa época sem os poderosos supermercados e chiques delikatessens de hoje, abastecia Montes Claros do que de melhor e finesse havia em comidas e bebidas das Oropa, França e Bahia, como diria Jair Silva. Filmagens lindas e históricas do antigo Carnaval e futebol montesclarense.Rolos e mais rolos. Já vi alguns.Alô Secretaria da Cultura : até hoje, os filhos (relacionados abaixo ) conservam com carinho este acervo. Lances de jogos e gols de memoráveis Cassimiro e Ateneu, carnaval de rua e bailes nos salões do Clube Montes Claros. De arrasar. Nos aniversários de Mazinho, Fuiu, Jaya, Vaguinho, Valdo, Fátima, Kátia e Ludmila, Seu Itajahy, com a maior vibração, sempre passava um filme novo ( foi ali que vi a Ilha do Tesouro, do primeiro pirata de olho de vidro e papagaio no ombro ), com direito à livre degustação de todos os sabores de sorvete Kibon - vinha de avião, do Rio, acondicionado em caixas de gelo seco – servido sem miséria em taças de prata. A meninada, literalmente, boquiaberta. Tudo isso - ainda e sempre - com o maior dos sorrisos e gentilezas da adorável D.Hilda Loyola. Aí vi a foto do ginásio, destelhado.As telhas na calçada e na chuva. Que tristeza. Espero, pelo menos, que o supermercado seja tão bom e variado quanto foi o Armazém Loyola. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 8/3/2006 11:40:09 |
PROMESSAS CUMPRIDAS, FINALMENTE (MURAL -06/03/06 - 17h - Galinhas mutantes desenvolvem dentes semelhantes aos de crocodilo) Eu e (certamente) toda uma geração de crédulos meninos do interior, montes-clarenses (quiçá mineiros e brasileiros), que acreditavam em aparição de lobisomem nas noites de lua cheia, saci pererê - que poderia ser apanhado com peneira - rodopiando no meio de redemoinhos, mula-sem-cabeça e outros bichos fantasmagóricos do imaginário popular, amanhecemos mais felizes neste início de semana, deliciando-nos com esta notícia publicada no Mural e em jornais do mundo inteiro. É que , finalmente, vamos fazer jus a vários desejos reprimidos, possíveis dívidas impagáveis, e ainda, nos tornarmos aptos a receber mil recompensas prometidas naquele tempo por todos aqueles (e aquelas) insensatos que tudo ofereciam e, na hora de pagar, saíam-se pela tangente com o execrável e proverbial “no dia em que a galinha nascer dentes”. Era bem assim que se dizia. Certa vez, uma moça, bem mais velha do que eu, que me prometeu um beijo. Na boca, imaginem, a doidivanas. Não sei quando ou como, mas num certo dia ela prometeu. Com aquela voz melosa e sensual, aqueles dois olhos castanhos, os cabelos negros e esvoaçantes de Rita Hayworth em Gilda. E, quando eu lhe cobrava - diariamente, ouso confessar, tamanha era a paixão – ao passar na porta de minha casa indo para o Colégio Imaculada, ela dizia a mesma coisa : “no dia em que a galinha nascer dentes”. Foi assim, por um ano inteiro. Até um dia em que ela - não sei, mas me pareceu cansada (e com razão) das apaixonadas cobranças - foi categórica, ao dizer, para tornar ainda mais cruel minha completa ruína sentimental. Uma só e última vez : - No Dia de São Nunca...de tarde ! Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 2/3/2006 16:04:14 |
NOTÍCIAS MAIS LIDAS : (ANO DE 2057 D.C) Bi-Centenário de Montes Claros Já passados 10 anos do saneamento total do Rio Vieira , Montes Claros se prepara para as comemorações do Bi-Centenário, ocasião em que teremos uma semana de intensas festividades, culminando com uma etapa do Grande Circuito Internacional de Canoagem, nas azuis e caudalosas águas do Rio Vieira (vejam a linda foto noturna, clicada pelo fotógrafo da 98 FM, esta rádio que está com vocês há quase setenta anos). Após a canoagem teremos o grande concurso de Pesca ao Dourado e Piau, que toda a população poderá participar ao longo da maravilhosa margem do rio, lindamente ajardinada e florida de perpétuas, jasmins e damas da noite, obra prima da Secretaria de Meio Ambiente. O Festival do Pequi, esperado por todos, mais uma vez não poderá ser realizado, por absoluta falta do produto principal (de cor amarela, lembram-se) que não é mais achado de jeito nenhum (nem congelado) , uma vez que os três últimos pequizeiros do sertão norte-mineiro foram levados para o Museu do Cerrado Antigo, em Brasília, em 2032. Abraços a todos. Flavio Pinto (A bela foto enviada pelo leitor Mauro Miranda Ferreira foi deliberadamente invertida pelo escritor Flávio Pinto) |
Por Flavio Pinto - 26/2/2006 12:22:16 |
FAROFA DE TATU Terra,América do Sul,Brasil, Minas Gerais, Montes Claros, Rua de Trás e Larguinho. Se um disco voador tentasse me abduzir naquele início de década de 50, estas seriam as melhores coordenadas para o meu eventual e eficaz recolhimento espacial. Mas, felizmente (ou infelizmente, poderão dizer os ovnistas militantes) tal peripécia nunca aconteceu comigo nem para o resto da turma, que fazia ali da Rua de Trás e Larguinho do Rosário seu ponto preferido para a toda espécie de brincadeiras, diurnas e noturnas. Acho que só efetivamente aconteceu pra Zezinho Lagartixa que, apesar de não ser da turma do Larguinho, aparecia ali esporadicamente (talvez pelas freqüentes escapulidas para o espaço sideral), para participar das peladas vespertinas, e já tinha experimentado a inusitada aventura espacial por mais de uma vez. Zezinho aparecia sempre com duas trouxinhas, uma em cada mão, com seus invariáveis óculos de vidro espelhado - última moda nos camelôs da Praça do Mercado - que anunciava , de longe, sua querida presença, pelos reflexos do sol que fazia questão de nos jogar nas vistas, dando sempre uma risadinha de lado. Não se fazia de rogado e contava as aventuras sempre de tardinha, após a última pelada, os olhos escondidos atrás dos óculos - o que lhe dava um discreto ar professoral - com uma preciosidade de detalhes de fazer inveja a qualquer escritor de ficção científica. O jeito dele – especial - de contar os casos fazia a diferença e nos tornava cativos ouvintes até a hora que resolvia ir embora, quando se lembrava de ter de levar a feira (as duas trouxinhas, lembram-se ?) para a mãe, que morava lá pras bandas do Rio do Melo. Bom filho, o Lagartixa. Um dia, brindou-nos com um primor de criação artística : um carro de boi a jato, cujas turbinas ficavam grudadas no rabo do boi e somente ligavam quando o condutor gritava o nome do bicho : “Vai lá Pintado, vem cá Rochedo...” assim que o animal ouvia o nome, levantava o rabo e ligava o motor, alçando vôo rapidamente e atingindo em pouco segundos a velocidade de mil quilômetros por hora. Se alguém da platéia iniciasse ou esboçasse qualquer movimento que pudesse significar ou transparecer alguma dúvida, ele logo se adiantava: “ Eu sei , parece mentira... mas é a pura verdade. A velocidade era tanta que os bois nem botavam a língua para fora...”.. Ante tal argumento, falar o quê ? E lá voltava ele, na semana ou quinzena seguinte, com mais deliciosas estórias espaciais. Sempre um bicho conhecido de todos personificando um alienígena. Duro de agüentar, eu sei, mas nós agüentávamos, pelo bem da diversão gratuita. Mas a do tatu hipnotizador...Essa foi difícil ! Imaginem que lá num dos benditos planetas onde ele esteve (foram vários) o povo morria de medo de um tal tatu hipnotizador que, ao simples olhar dominava as mentes dos habitantes e levava-os para o fundo da terra, para trabalhar como escravos, cavando buracos e deixando o maléfico e sua família na maior boa vida, folgados e desobrigados daquela histórica função, própria de qualquer de qualquer tatu que se preze. Aí, Zezinho Lagartixa foi fundo. - Mostrei pra eles estes óculos ( tirou os óculos e deixou-nos, pela primeira vez, tocá-los) e falei para fazerem milhares iguais para toda a população e sempre os usassem quando o disgramado do tatu aparecesse.... Foi a conta : o tatu olhava para os marcianinhos com os óculos espelhados e não acontecia mais nada. Ele foi ficando com medo e recuou, o povo invadiu os buracos, libertou os escravos e sabe o que fizeram com o hipnotizador ? Um menino, atrás de mim, gritou : “Farofa de tatu”. Zezinho pegou as trouxinhas, tomou os óculos e rachou fora, resmungando. - Conto mais bosta nenhuma procês ! Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 15/2/2006 11:21:54 |
DE ROÇA MOLHADA E ONÇA PINTADA Não sei se foi ontem, ou no ano passado, mas tenho certeza que foi num dia desses. Estranho é que a gente se lembra com tanta saudade, que chega doer no coração , de leve, tipo medo de não se repetir jamais. Naquela velha cozinha da fazenda, noite e madrugada se misturavam na beirada do aceso fogão de lenha que, além de aquecer o sereno da noite, era o grande responsável pelo tira-gosto à altura de velhos amigos que se reencontravam, agrupados à sua frente, em volta da centenária e ainda firme mesa de madeira, de três metros de comprimento e muita história pra contar. Sentados nos bancos de aroeira os mais chegados se revezavam no ir e vir à chapa gigante de ferro batido, já preparada e completamente untada de gordura (da carne de sol) para receber aqueles bifes previamente cortados, que ficavam ali, graciosos em seus coloridos dois pelos e bem amontoados dentro de uma grande - e já corroída pelo tempo - gamela de pau . À espera de serem fritos, mal ou bem passados, dependendo do gosto do freguês, eram pegos e levados ao fogo pelo grande garfo do capeta (poderoso tridente que em outros tempos já até servira para pescar incautas curimatãs que insistiam em ficar pitando no córrego do fundo do quintal) para logo serem levados à mesa e fatiados numa grande tábua, salpicada pelos quatro cantos de pimenta “malaguetinha” e farinha. Lá de Morro Alto. Mais aquele caldo de mandioca e arroz com pequi feitos com ciência durante toda à tarde pela cozinheira oficial da fazenda e deixados no borralho para sustentação da turma. Pro mais adiante da noite. Que ia ser longa, ela já sabia. Lá fora, a chuva não dava descanso. Graças a Deus, molhado cheiro de mato. As mariposas, imprudentes como sempre, teimavam em procurar luzes dentro de casa e de vez em quando, uma ou outra, desvairada, caía na chapa quente. Imaginem vocês, quando era tanajura, tinha gente que até a misturava na farinha e...comia, onde já se viu! Tonto, fazendo bonito, porém muito aplaudido. Também, em cima da mesa, um garrafão de um “ex-vinho Cabeça de Touro”, atualizado até a tampa por uma deliciosa Viriatinha de 15 anos, confirmada e assinada a procedência e idade pelo dono, o grande cantador Beto Viriato. Se bem me lembro tinha umas Canarinhas cantando, afinadas, e uma Santa Rosa rezando. Todas, dando conta do recado, direitinho. Na grande mesa, um povo tomando vinho, outro povo arregaçando na cerveja, cujo ninho era o tanque de lavar roupa, com gelo e serragem até o tampo. As pingas só entravam nos intervalos da cerveja e do vinho. Povo sem termo! As conversas já lá iam adiantadas, até chegar na preferida dessas ocasiões, sempre a mesma coisa naquele norte querido : conversa de onça, onça pintada, sem pintas, enfim, onça de todo e qualquer jeito. Nunca vi gente gostar tanto de uma mesma conversa. Todo mundo dá palpite, cada um conta um caso, do tio, do avô e dos perigos acontecidos por conta da presença da pintada. E cada ano os casos ficam melhores. Até a hora que um tocador pega na viola e canta : “ Um tocador, de violão, não pode tentar prosseguir quando lhe acusam de estar mentindo...” Como diz o outro : aí pode largar... Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 13/2/2006 11:45:49 |
PARA UMA VIDA MELHOR ? Com o advento da Internet e seus novos e nomeados conselheiros (por quem?), a gente, hoje em dia, nem precisa ter o trabalho de pensar no que fazer para se obter a melhor das caminhadas, nesta curta - porém tortuosa - vida terrena. Ou, melhor traduzindo, tentar ser feliz. Consultores e assessores gratuitos para um melhor destino (se é que destino pode se mudar) se (auto) incumbem desta nobre missão e adentram nossos computadores, diariamente, em pausadas e irritantes parábolas sobre o bem estar que advirá do fiel cumprimento de suas espirituais mensagens. Caso não as passemos pra frente, não as inocularmos de nossa fé e assinatura para familiares e tantos ou mais diletos amigos, estaremos alijados para sempre do bem-estar celestial, da serena calma e o manso navegar nas águas tranqüilas do mar da felicidade eterna. Como nossas próprias idéias e deuses tupiniquins não se consolidam profundos - o suficiente - para alcançarem o espiritual valor pretendido, são invocados espíritos e pensamentos de terras longínquas, cujos autores, mortos e ressuscitados diariamente pelos oportunistas e plagiadores de plantão, devem se virar e desvirar – de desânimo - nos seus respectivos e sagrados túmulos. Nobres pensadores que – coitados - num certo dia, há milhares de anos atrás, crentes que seus cânticos, frases e parábolas se eternizariam como fontes do bem e do saber, até pensaram merecer e querer um longo, calmo e profundo sono eterno. Deus me perdoe, mas será que querem nos assombrar ? Será? Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 23/1/2006 12:24:52 |
COLÉGIO IMACULADA Ah! Apaixonado menino...Onde estará? De lânguidos olhares à espera da amada, postado na sombra da árvore do canteiro do meio da Rua da Fábrica. Todos os meios dias de todos os dias na frente do Imaculada, na saída do turno da manhã. E aquela freira que olhava. A mesma freira no portão - como se estivesse numa foto antiga na frente de medievais castelos – com uma grande chave de ferro amarrada a um grosso cordão branco preso na cintura, sempre fingindo um olhar sério, mas com um indecifrável sorriso da Gioconda, torcendo, imperceptivelmente, a favor do amor. Um rápido beijo, livros e cadernos trocando de mãos e o caminhar juntos para casa, passos contados e sorrisos incontidos na alegria do apenas estar perto. De noite, assobiando. “Enluarada noite, de sete estrelas...” Abraços a todos. Flavio Pinto Ps: Vi a Cel.Prates, de cima, ontem, amanheci assim, hoje, nesta bestagem, a saudade doendo. ( Nota da Redação: A pintura de Hélio (Patão) Guedes retrata a antiga fachada do Colégio Imaculada, o "colégio das freiras", prédio lamentavelmente demolido na década de 80; o casarão foi residência do coronel Francisco Ribeiro, que ao morrer deixou sólida fortuna para os seus descendentes - irmãos e sobrinhos - da família Ribeiro). |
Por Flavio Pinto - 13/1/2006 21:00:15 |
PORCOS E PRATOS VERDES Um prato que sempre gostei - aliás todo mineiro que se preze e não tenha problemas com colesterol e estas coisitas à toa que levam o cidadão, devagarzinho, ao cemitério, gosta – é um leitãozinho à pururuca. Prato obrigatório no Natal , mas que nós, mineiros adoramos comer e repetir o ano inteiro. Mas, vocês me desculpem a franqueza, porco verde eu não como não, e nunca comerei, já vou adiantando para o pessoal de Taiwan. Até que comprar um relógio baratinho à prova d’água - que não agüenta nem cheiro de neblina - posso, até. Mas é só. Embora confesse, deixando na trilha da imaginação a veia culinária me levar, me passasse levemente pela cabeça que uma leitoa verde com arroz branco e pequi poderia até ser um belo de um prato patriótico, digno de reis e presidentes estrangeiros em Brasília. E o azul ? Perguntarão logo os mais afoitos, e eu lhes direi : o pequi é lá de Campo Azul ! E está morta Inês. Eu vi no Mural um alerta sobre essa modificação genética, que parece estar em moda por este mundo afora onde o povo não tem mais o que inventar. Mutatis, mutandis, lembro de já ter me ocorrido vontades e necessidades de promover eventuais mutações genéticas, como a querer consertar certas coisas para a felicidade do bem comum. Na política também, onde existe o vermelho vergonha de trair o voto recebido e o amarelo burro fugido de não cumprir as promessas feitas antes da eleição. Mas isso é outra coisa... Das que eu, pseudocientista de fundo de quintal, já pensara em mudar a original coloração, tentando fazer parte desta modernidade pré-apocalíptica, uma, com toda a certeza, seria passar o abacate para outra cor que não fosse o verde. Inclusive a própria casca. Mas não passou da simples idéia. E explico : meus filhos, quando pequenos, nunca o comiam porque não gostavam de nada verde, aí incluído todo e qualquer tipo de verdura ou legumes levemente esverdeados. Era quando eu, preocupado e antiquado pai, lhes apresentava, então, com ares de vitória, cenouras e beterrabas e, do mesmo jeito, sem nenhuma alegação plausível, eles também os rejeitavam, apesar do colorido diferente. Acho que foi aí que minha carreira de futuro cientista louco transformador genético se encerrou. Quanto ao abacate, anos mais tarde vim prová-lo com sal e temperos, o famoso “guacamole” item obrigatório do cardápio da comida típica mexicana e não detestei de todo, desde que acompanhado de alguma carne, permanecendo a verde coloração com sucesso. Desde que você o prepare e sirva logo, senão escurece. O petisco mexicano, não o céu. Abraços a todos. Flavio Pinto |
Por Flavio Pinto - 9/1/2006 10:49:31 |
PRAGA DE NORTE-MINEIRO Para todos aqueles que nos proporcionaram e contribuíram para a sublime desventura e vergonha de chegarmos a este ponto, de ter que nos sujeitarmos ao pagamento de um espúrio pedágio para ir além dessa placa , nesta outrora linda estrada asfaltada (que já foi nosso orgulho) conseguida a duras penas e pedida até em versos pela nossa fina flor musical... ...Para todos esses que esconderam e desviaram as verbas de manutenção/conservação da nossa estrada, agindo tal e como desequilibradas - e foras de moda - primas donas , em longas e particulares saias-justas de prejuízo completo ao bem público de nossa comunidade norte- mineira... ...Para todos eles, que o povo sabe muito bem quem são : eu, modesto escrevinhador deste Mural, vendo impedido - não pelos ínfimos dez contos em si, mas pela simbologia histórica que representa - o meu livre caminhar, o meu ir e vir normal de toda a vida para a minha terra, para o meu sagrado canto no mundo, que eu tanto amo; Para aqueles, para esses e para eles, eu dedico estas palavras de Dante Alighieri ( e o lugar também ), da sua imortal obra "A Divina Comédia": "CANTO XXI -Vala dos corruptos - Malebranche (demônios) De cima de outra ponte paramos para ver a próxima fissura de Malebolge, que era incrivelmente escura. Lá embaixo um grosso breu fervia. Eu olhava mas nada via a não ser as bolhas de piche que a fervura levantava. Enquanto meus olhos procuravam alguma coisa naquela escuridão, meu guia gritou: - Cuidado, cuidado! - e logo me arrancou do lugar de onde eu estava. Voltei-me e vi logo atrás um diabo preto que corria em nossa direção. Ai, mas como ele tinha um aspecto feroz! Com suas asas abertas ele corria ligeiro com os pés. Levava um pecador no seu ombro pontiagudo, que pelos tendões dos pés tinha seguro. Parou diante da pez fervente, e gritou: - Ó Malebranche, aqui está mais um daqueles anciões devotos de Santa Zita. Cuida dele pois eu vou buscar outros. Quase todos naquela terra são corruptos, exceto, é claro, Bonturo! Lá, com dinheiro, qualquer não vira um sim. Depois que falou, soltou o pecador das alturas, que submergiu no líquido espesso. O diabo voltou correndo pelos recifes e sumiu na escuridão. O pecador ainda tentou ressurgir na superfície, mas vários demônios que estavam sob a ponte saíram e o perfuraram com mais de cem garfos, levando-o a outra vez submergir". Abraços a todos, menos estes ... Flavio Pinto |